Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]


EUCALIPTO DE FOGO

por Zilda Cardoso, em 23.05.10

 

 

No azul deslumbrado ele sobe borbulhante

aceso expande-se num bang-bang

de mil sóis e chamas faiscantes

 

melros novos não pousam por respeito

nos ramos abrasados de luz

nas flores irradiantes

 

Símbolo de Julho em Moledo clama

no clamor do calor de Verão

por atenção

 

o grito ecoa de montanha em montanha

escande-se e continuamente recomeça

perturbando a multidão

 

que rendida ovaciona junto à piscina

sagrando o eucalipto cor de fogo

estátua templo altar

 

ou herói terrível de intenso esplendor

Faetonte do meio-dia por alguns dias

neste lugar.

 

 

(Em Moledo do Minho no Verão de há vários anos)

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 12:44

A IMPORTÂNCIA DO SOL

por Zilda Cardoso, em 02.02.09

O meu neto (o que nasceu com este blog) está doente. Será uma gripe daquelas e ele sofre e toda a família com ele. Não posso deixar de pensar que os médicos são umas pestes e não compreendem nada de nada. NADA DE NADA.

E fico a olhar para ele e a não saber como ajudá-lo. Vejo um rosto que desconheço, olhos que não são os dele, antes enormes e verdes e agora pequeninos e estranhos com uma sombra castanha e redonda a toda a volta. Respira mal, tosse de vez em quando, ainda espirra, não liga muito aos brinquedos, fecha os olhos durante um tempo. Perdeu as rosas sobre o branco da sua face.

A mãe tem-no sempre polido, asseado, penteado, aconteça o que acontecer. Na cabeceira da cama, há bonecos amorosos de tecidos suaves, cores a condizer com as do pijama. Os cortinados, as paredes, as roupas de cama, os móveis... tudo cheira bem e, como se diz na gíria, é lindo de morrer.

 

A casa é graciosa, limpa e organizada pela Mariana segundo padrões rigorosos e um gosto moderno e harmonioso. Não é possível abrir uma gaveta ou a porta de um armário e ver algo fora do sítio. Tudo tem o seu lugar segundo a cor, a forma, o material de que se compõe e o fim a que se destina.

Os quartos de banho têm frescos de flores e de paisagens nas paredes e a cozinha combina a maior funcionalidade com uma beleza indiscutível.

O ambiente não está contaminado por excesso de objectos e há uma relação perfeita entre os modernos e os antigos, os que fazem sorrir e os puramente utilitários, os artísticos e os… quais?

É um deleite estar em sua casa, é apaziguante, sabendo embora quanto esta ordem custa a manter sobretudo quando  poucos estão dispostos a contribuir, muito pelo contrário, para haver e poder proporcionar esse prazer e essa serenidade.

É um mundo aparte, novo e cor-de-rosa, permanentemente no primeiro lugar de qualquer quadro de honra rigoroso e justo. Apenas espero que esta ordem se não transforme numa obsessão para a Mariana.

Dou corda aos bonecos que pairam sobre o berço e ouve-se “quand trois poules vont au champ /la première marche devant…” Ele escuta em silêncio, depois dá uma pancada num dos elementos do conjunto e todos rodam – a plêiade de estrelas, o crescente da lua, os ursos abraçados ao patinho feio “for ever friends”. A música pára e ele entusiasma-se por momentos com este mundo que não tem um sol, e também não faz mal – o Sol é uma estrela de “irrelevância cósmica”. Mas existe uma nuvem que eu acharia simpática, branca e risonha, densa de moléculas que o impede de observar as estrelas que estão por trás.

 Visivelmente, o meu novel neto discorda de mim: dá uma forte pancada na lua pálida com olhos azuis e boca de riso, a nuvem gira com ela e as estrelas aparecem no seu horizonte.

Com o entusiasmo vem a tosse e um grito de desgosto.

Sinto pena e interrogo-me: Que será deste cosmos amanhã?

 

 

 

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 20:44

Desconcerto, opus nº 2

por Zilda Cardoso, em 01.11.08

 

 

Continuo a leitura das Oitavas de Camões.

O Poeta escreve: “… se este estranho desconcerto novamente (ou pela primeira vez?) no mundo se mostrasse, que por livre que fosse e mui esperto, não era de espantar se me espantasse”.

Quinhentos anos depois, anos de liberdade e de esperteza, seria de espantar se qualquer de nós se espantasse ainda com o estado do mundo.

Ele está desconcertado e foi posto assim pelos que o habitam e o vão desarrumando desde há muitos séculos ou desde sempre. Não sei se alguma vez o compuseram ou intentaram alinhá-lo ou se, por sistema, deixaram isso aos heróis e semi-deuses, quiçá aos deuses. Que não tiveram muito êxito.

“Não é para causar mui grande espanto que mal tão mal olhado dure tanto”. 

O que parece estar a acontecer, já aconteceu mil vezes antes.

Talvez seja mais divertido assim, por isso não nos empenhamos em compô-lo.

 

 

Pensando bem, já tem havido tentativas, mas com o decorrer dos séculos, vão ficando esquecidas.

Será mais interessante deste modo, sobretudo para quem o aprecie de grande distância e de fora.

Acontece que não é só o nosso planeta no seu interior que está desconcertado, mas o sistema. Vejam o Sol no seu movimento anual: em vez de traçar um percurso certinho em volta da Terra, paralelamente ao equador, ele faz uma trajectória elíptica, por isso, o ângulo horário medido entre a elíptica do Sol e o equador não é constante. E a órbita da Terra em torno do Sol é elíptica também, por isso, o movimento do Sol é mais rápido nos meses de Inverno. De tudo resulta que   não há nenhum dia igual ao outro, por mais que se procure… e que se mude a hora...e que não gostemos de a mudar. Nem mesmo os dias do ano anterior da mesmíssima época são iguais aos deste ano.

 

 

 

 

E sobre o Sol, reparem, o seu movimento não é autêntico como seria de esperar tratando-se de um assunto fundamental. Sabemos que é aparente e tudo o que concluímos sobre o seu movimento é a dissimular, é astucioso, camuflado, mascarado. Dizemos: o Sol roda em volta da Terra, mas sabemos que é a Terra que gira em volta do Sol.

E assim por diante: tudo desconcertado.

Como assim? Não podemos fazer nada? Ou vamos concertar isto? Ou consertar? Fingiremos que acreditamos e continuamos a seguir o exemplo das estrelas que, (acontece com o Sol), aparentemente brilham para nós?

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 10:23




Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Pesquisar

  Pesquisar no Blog



Arquivo

  1. 2022
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2021
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2020
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2019
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2018
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2017
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2016
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2015
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2014
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2013
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2012
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2011
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2010
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2009
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2008
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D