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Atirava-se repetidamente contra o vidro da porta da varanda e eu pensava que tinha tristes ideias sobre a vida que lhe era dado viver. E queria... não... bater com a porta, mas bater-se contra a porta, chamar a atenção. E despedir-se.
Estava farto.
Vi várias vezes em verões passados, pássaros atirarem-se com violência contra os vidros e morrerem pouco depois, pescoço partido.
Colámos pássaros negros de papel nesses vidros, medonhos, e os verdadeiros receavam-nos tanto que se não aproximavam. E deixaram de morrer por ali.
Este peito cor de fogo era meigo e raspava-se docemente contra o vidro, sem violência, bicava-o com ligeireza, insistia durante horas. Desaparecia e voltava daí a um pouco com as mesmas manobras.
Na verdade, fazia um longo intervalo entre duas dessas prolongadas sessões. A segunda era ao fim da tarde, à hora de jantar.
No dia seguinte, voltava, repetia tudo. E no outro dia e no outro.
Depois desapareceu de vez.
Hoje, porque se foi, espreitei o vidro da sua preferência, todo manchado, embaciado com longas estradas a todo o comprimento e mínimos restos não sei de quê.
Pensando melhor, ele devia vir almoçar e jantar minúsculos insectos, as moscas pousados no vidro. Até que se aborreceu de moscas.
Ou então o belo pássaro cor de fogo queria simplesmente visitar-me, entrar pela casa dentro e cantar para mim trinados tão ardentes como a cor do seu peito.
Queria falar-me de amor e...
Eu não percebi.
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