O mito não é um objecto, não é um conceito, não é uma ideia. Também não é uma fala qualquer, é uma mensagem. O mito não se define pelo objecto da sua mensagem, mas pela maneira como o enuncia e ”mais pela intenção do que pela sua letra”. Mais ou menos assim, escreveu R. Barthes.
A linguagem de que o mito se serve para construir o seu próprio sistema de comunicação pode ter como suporte escritas ou representações como a pintura e a escultura, o teatro, a fotografia, o bailado, o cinema, o cartaz… Todas estas linguagens podem fazer, a seu modo, a mesma narrativa.
No mito de Ariadne, podemos encontrar muito diversas mensagens.
Ela é princesa, jovem e bela, mas o que brilha nela é a inteligência. Desde que estimulada pelo amor, encontra em si capacidade de solucionar de forma simples e lógica problemas antigos e extremamente complicados, para os quais ninguém descobrira desfecho.
A desvanecida Ariadne seguiu o super-herói que matou o monstro segundo o método dela, mas que logo a abandonou para continuar caminho para outras disputas que lhe valeriam renovado prestígio.
No entanto, Afrodite promete à jovem solitária um amor imortal, conseguido.
Quais serão as mensagens neste caso?
Ela reconhece o valor do herói, ele não reconhece o valor dela nem o valor do amor que lhe é oferecido? A ela, não lhe serviu de nada a inteligência? Apenas um deus satisfará o seu desejo de ser amada? Apenas um deus a merece? Os heróis são para serem amados, não para… amarem?
Cada um descobrirá, visto que a matéria do mito foi trabalhada de modo a ter determinada significação, mas é uma forma e não precisa ter sentido, desde logo. Ou terá um sentido diferente. Desvalorizado e revalorizado. Ou deformado. Verdadeiramente interessam significações que nunca são inteiramente arbitrárias.
Muitos problemas de lógica podem ser resolvidos pelo método simples de Ariadne, chamado indutivo. Muitas ciências usam este método de pesquisa, baseado na experiência e na observação.
Modernamente, o quebra cabeças Sudoku usa o método indutivo. E é evidente também que se pode sair de um labirinto concreto usando o mesmo método. Aplica-se em jogos de computador, em pesquisa e navegação da web…
Por outro lado, terei eu usado o mito de Ariadne como um sinal? E o fazer referência a um mito muito antigo, dará credibilidade àquilo de que estou a falar ou a escrever? Talvez me acreditem melhor se disser que este mito foi contado por Miguel Ângelo, por Leonardo Da Vinci, por Ticiano, por Poussin; que está nos frescos da vila dos Mistérios em Pompeia, numa ópera de R. Strauss, num bailado de Roussel…
Pedem-me para contar a história que justifica o título do blog.
Começo pelo mito de Ariadne, cruzado com outros mitos como o do deus Dionísio e o do Minotauro, e poderei resumi-lo aqui, assim:
Ariadne, filha do rei de Creta Minos, apaixonou-se por Teseu, filho de Egeu, rei de Atenas.
Ele era um jovem herói capaz de matar o Minotauro – todos gostariam de matar o monstro corpo de homem, cabeça de touro, resultado dos amores insensatos de Pasifae, mulher de Minos, por um touro branco.
Minos tinha pedido a Posídon que fizesse sair do mar um touro para mostrar ser mais digno de reinar do que seus irmãos, e o mais poderoso já que tinha o favor do deus. Prometeu Minos restituir o touro sagrado, mas em vez disso aprisionou-o num complicado labirinto concebido por Dédalo, donde ninguém saía - por não encontrar a saída e por acabar devorado pelo monstro.
O rei de Atenas organizou os jogos atléticos em que o filho de Minos, Andrógeo, ganhou todos os concursos. Mandou-o então combater o touro, sabendo que isso era e querendo que fosse um envio para a morte.
Minos jurou vingança, fez a guerra e Atenas foi cercada. O rei Egeu teve de comprometer-se, para que fosse levantado o cerco, a enviar a Creta periodicamente um grupo de jovens que serviriam de alimento do Minotauro.
Teseu participou desse grupo e entrou no labirinto. Ariadne, apaixonada por ele, decidiu ajudá-lo a encontrar a saída. Engendrou um processo simples: ele levaria um novelo de lã que ela seguraria firmemente à entrada. Ele ia desenrolando o fio à medida que avançava e depois de lutar com o monstro e o vencer (a pitonisa informara-o de que venceria se fosse amparado pelo amor), pôde encontrar o caminho do regresso, onde Ariadne o esperava com novelo e paixão.
Teseu fugiu com ela, mas abandonou-a na ilha de Naxos, onde tinham parado para descansar. Vendo-se só, invocou a deusa Afrodite que lhe prometeu um amante imortal. Foi Dionísio, o deus do vinho e da festa popular, que casou com ela, doce, loira e linda, e lhe ofereceu uma coroa de ouro, cravejada de pedras preciosas. Ariadne fez-lhe prometer que a atiraria ao céu quando ela morresse.
Por isso, podemos ver hoje no céu uma constelação de estrelas brilhantes com a forma de coroa.
Este é o mito.
Contarei mais tarde porque razão a figura de Ariadne me entusiasma.