É fácil imaginar um arquipélago na laguna de Veneza, talvez alguém no século V, fugido de invasões no seu país, tenha acrescentado umas pedras aqui e ali; e foi criado um espaço protegido de ataques externos por perigosos bancos de areia e por lagoas baixas, uma cidade única e poderosa no noroeste do mar Adriático. No século X era um império comercial e económico, com uma frota extensíssima, comandado pelos doges com feitorias e controle de rotas comerciais no Levante.
Não podia deixar de ser Património da Humanidade, não apenas pelos monumentos, pela basílica de São Marcos, pela Praça de São Marcos e pelos pombos, pela ponte de Rialto e pela dos Suspiros, por igrejas e museus e galerias de arte, por palácios e uma importante biblioteca com uma das mais ricas colecções de manuscritos do mundo e documentos que são raridades, mas pela sua configuração e estrutura.
Festivais de cinema e de artes realizam-se cada ano, assim como a Regata Histórica e um Carnaval espectacular de dez dias.
Na lagoa de Veneza, república que limitava os poderes dos chefes, doges ou duques desde o século IX, há outras ilhas, como a Lido dos festivais de cinema e a Murano onde se fabrica o vidro. Na cidade que tem 177 canais, 400 pontes e 118 ilhas (verifiquem na Internet) não circulam carros mas barcos colectivos ou vaporetos, embarcações privadas e barcos táxis e andar-se-ia muito bem a pé, se não fossem os milhares de turistas que permanentemente circulam e se acotovelam e formam intermináveis filas na frente dos lugares a visitar.
E há as gôndolas, naturalmente, pintadas de negro e dourado e os gondoleiros vestidos a rigor que em tempos cantavam espontaneamente no melhor estilo operático, mas que no presente se fazem acompanhar de instrumentistas a pedido e bem pagos. Vimos dois ou três pares de noivos muito fotografados de gôndola ou a caminhar pela cidade com os seus fatos de cerimónia.
Quando lá estive a primeira vez, rescendia por ali de forma desagradável excepto no Grande Canal mas, agora, podem ir à vontade, está tudo muito limpo.
Sedimentos chegam de todo o lado e água dos rios e do mar e vento pelo que é necessário vigiar o equilíbrio das águas continuamente. Há com frequência inundações nas partes baixas da cidade, as fundações das casas são difíceis e as ideias brilhantes surgem a propósito.
Seja como for, a cidade é um encanto com a sua música-que-ninguém-toca e constato que não me importava nada de viver num daqueles palácios com patera e uma lancha e cais de saída para o Grande Canal. Não me importava nada.
Não sei o que pensará o meu neto de tudo isto.