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O pôr do Sol

por Zilda Cardoso, em 14.04.15

 

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Estou a instalar-me num cansaço enorme de que não sei se em algum tempo sairei. Ou quererei sair.

É tão confortável este dar-se à moleza, o obedecer à rotina, o não se deixar atrair pelas novidades! E também, já agora, o não beber água que não apetece, o não fazer o exercício que nos é recomendado, o não se abrir a ideias novas…

As ideias novas, então, requerem grande esforço para engendrar e colocar no mundo. Conceber e criar condições para que sirvam também aos outros.

Todo o processo de criação dá uma trabalheira tremenda. E as pessoas que se consideram na idade de descansar, que são tantas, gostam de repetir vezes sem conta as mesmas palavras, idênticos gestos, acções e expressões, não se fartam deles.

O pior vai ser, está a ser, quando jovens com espaço na cabeça para receberem as novidades enriquecedoras, passam a vida repetindo-se e repetindo o repetido, numa tautologia sem fim, como se fosse fundamental para a sua vida e a de alguém. Como se não estivessem neste mundo justamente para acrescentar qualquer coisa ao que existia anteriormente, como se não lhes tivesse sido ensinado a pensar por si. E como se não tivessem sonhos para e por realizar.

O pequenino de seis anos diz: “Não posso desistir, não é, avó?” Pois, não podes. Tens que te esforçar, não esperar que te façam as coisas nem que seja apertar os difíceis botões da camisa.

Foi o que lhe respondi, porém para mim pensei: às vezes, é melhor desistir. Quando insistir passa a ser irracional. Como sempre há que descobrir o limite a partir do qual é estúpido continuar.

Fiquei a pensar no “não desistir” do menino que, como é natural, leva estas recomendações muito a sério. E que, se continuar a levar a sério o que é sério, será um elemento tremendamente válido na governação futura do País ou seja do que for. Da sua própria vida, por exemplo.

Um dia destes, dizia-lhe eu, genuinamente impressionada com os seus conhecimentos: Tu sabes tudo! Ele replicou logo com o ar mais sério e reprovador deste mundo: “Eu não sei tudo, avó! Há muitas coisas que não sei, como… isto… aquilo… aqueloutro". Enumerou. E eu calculo bem o volume e o peso do que ele não sabe ainda porque, segundo as suas palavras, não teve tempo de aprender.

Esta foi a parte mais interessante da nossa conversa: a conclusão a que chegou de que tem muito para aprender. E está na disposição de assimilar, está a esforçar-se por o conseguir.

Ele nunca me pergunta coisas como “quantos anos tem a chuva?”, não faz perguntas insensatas. Quis saber por que estava já (a meio de uma brincadeira) a ficar noite.

Podia ter-lhe respondido de muitas maneiras, mas foi assim: é que o Sol está a chegar ao horizonte. Só falta um pedacinho, vês (dois ou três centímetros entre o polegar e o indicador), para atingir a água e mergulhar.

Ficou a pensar na lógica da minha resposta, talvez. Ele está a aprender a pensar.

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publicado às 09:19





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