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O encontro de há dias na Biblioteca Municipal Almeida Garrett foi especialmente interessante: Lídia Jorge é uma grande escritora que apreciei ouvir contar da sua experiência profissional. Falou de si e das razões de ter escolhido essa profissão. E de continuar a escrever 35 anos depois tão bonita e inteligente como quando começou, digo eu, mas agora muito mais sábia e experiente.
Na ocasião, não gostava, disse, da forma como os escritores portugueses escreviam nem dos temas abstractos que escolhiam. O mundo era diferente do que esses romances revelavam. Ela queria falar do que atinge o coração das pessoas. Era uma época revolucionária politicamente no País e era indispensável também uma revolução na literatura. Enfim, queria fazê-lo à sua maneira, escrever de outra forma num estilo que não era o ensinado na Faculdade de Letras que frequentou. Fugiria do romance tradicional e convencional, dos retratos psicológicos, da importância dos personagens e daquele lugar do narrador na intriga do que chamou a “carpintaria profunda”. E fugiria sobretudo do beau roman, da bela história.
Gostei de saber que tinha enviado o seu primeiro romance ao Vergílio Ferreira cuja opinião era importante para ela. Conhecia a sua mulher que não lhe deu muitas esperanças de que ele o lesse. Mas leu e gostou e disse-lho à sua maneira um tanto rude. Lídia Jorge enviou também o original a Agustina Bessa-Luís que lhe respondeu por escrito, um cartão em que dizia mais ou menos isto: “Benvinda a esta arca das desalianças. Oxalá a recebam bem, oxalá a leiam, oxalá lhe paguem”.
Que me perdoem, se não foram exactamente estas as palavras que Lídia contou, mas a ideia era essa. Lídia Jorge decidiu-se então a enviar para o editor O Dia dos Prodígios no seu estilo novo, pós-revolucionário. Obteve um sucesso imediato.
Gostava de registar aqui algumas das suas frases soltas a propósito de perguntas que lhe foram dirigidas.
“Os escritores são ouvidos porque se considera que sabem. Os escritores não podem errar. Os escritores actuais têm mais o pé na terra. Os escritores que estiveram em África num certo período tiveram vantagem sobre os que não viajaram”.
“Tenho grande respeito pelas pessoas que acreditam na transcendência”. “Há o medo e há o mistério”.
“Há a grandeza do cosmos”. “Queremos não sofrer e sofremos. Não queremos morrer e morremos”.
“O mundo é caótico e existe uma totalidade?”
“Temo-nos uns aos outros.”
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