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Tenho ideia de que na estação de Campanhã há escadas que é preciso descer e subir com a bagagem… A menos que já tivessem feito obras e houvesse elevador e possibilidade de travessia em ponte sobre as linhas. Entrei na plataforma com o desejo de que a do Pocinho fosse uma dessas da entrada, que não houvesse que atravessar coisa alguma, nada, nem subir nem descer.
Tinha comprado o bilhete e vi que não havia lugar marcado. Um empregado disse-me qual seria o comboio que não tinha lugares marcados. “Lugares marcados? Deixe-me rir! Olhe, o comboio para o Pocinho é esse, este do lado de cá, cuidado não entre no outro, vai parar a Valença.”
Não, não entro. Mas então este comboio…
“Isto nem é comboio nem é nada. Estava no lixo e nós fomos buscá-lo. Os portugueses compraram, recuperaram e puseram nos carris. São esses, parecem charutos, não têm nenhumas comodidades. Isto faz-me cá uma impressão! Nós fomos buscar à sucata. Estava mesmo lá, não estou a brincar!”.
Entrei receosa no comboio da sucata e sentei-me num lugar qualquer, pus as tralhas - mala, computador, saco de ombro - a meu lado, na outra cadeira e lá fui. Deixei-me ir.
O que mais me enfadou foi o cheiro de gasolina queimada de motores. Prefiro os antigos comboios a carvão. É tão saudável o aroma da lenha! Mesmo as faúlhas negras que, em tempos, nos cobriam a roupa ao fim de poucas horas, eram delicadas e perfumadas.
Mas, pronto! Começou a surgir a maravilha da paisagem e do rio verde e oleoso e quase esqueci o transtorno da sucata recuperada. Paguei €5,45 Porto-Pinhão, que podia reclamar?!
Ao revisor perguntei se o comboio parava muito tempo na estação do Pinhão e ele respondeu olhando-me com alguma rispidez: “O suficiente!” Fiquei deleitada com a inteligência dele. Como soube o que eu queria saber e para que queria saber? “O suficiente”, tinha ele dito e eu repetia para mim: sim, senhor! Compreendo: ele sabia o que eu queria saber e por que razão.
Senti-me encorajada a perguntar: E qual a estação imediatamente antes do Pinhão em que o comboio pára? “Covelinhas!”
Fiquei tranquila, só devo prestar atenção a este nome que de facto vi aparecer daí a pouco em letras graúdas na estação, ao meu lado. Depois de passá-la, comecei a sair para a plataforma do comboio e fiquei lá encostada. Alguém que já colocava as suas tralhas junto da porta – enorme pacote com rolos de papel higiénico e diversas coisas esquisitas e familiares – disse-me: “Mas o Pinhão ainda não é aqui”. Tem duas ou três estações antes”. E citou os nomes sem hesitação.
Deve saber, pensei. E agora, que faço? É na próxima? É bastante mais longe? Posso arranjar uma grande trapalhada se sair na próxima e só depois reparar que ainda não era… Para que é que me meto nestes comboios do lixo, em linhas esquisitas com apeadeiros cujos nomes não se vêem do lugar onde estou e por onde o comboio passa rápido, mesmo este, dito da sucata?
Fiquei a reflectir sobre as respostas possíveis. Na verdade, para que me interessaria saber as estações onde o comboio não parava antes daquela em que iria sair? Para muito pouco. Queria era estar prevenida contra a ansiedade do momento, para mim importantíssimo, de me escapulir.
O funcionário deve saber, que diabo! Mas… um diz-me que é a seguir, outro que ainda faltam três estações! Alguma coisa está errada.
Eu, enquanto não chegasse o momento capital do meu dia, estaria inquieta.
Não podia desperdiçar nenhum segundo de atenção no complicado percurso do lugar até à porta, não podia correr nenhum risco como de não chegar a tempo e de deixar passar a minha estação. Nem sabia como se abria a porta de saída! E se não estiver ninguém que saiba abrir a porta? Já vi que tem um fecho original, de todo invulgar! Garbage.
Logo a seguir, ressurge a senhora das tralhas requintadas e das certezas absolutas que me diz: “É aqui. Vê, não é a seguir a Covelinhas!”.
Agradeci. Ela não viu que o que me interessava eram as estações em que o comboio pararia, não aquelas que havia e eu nem via. E fez-me alguma confusão.
Mas foi muito prazenteira e ajudou-me com a mala amavelmente, depois de sair e colocar as coisas dela no chão do Pinhão.
Tinham-me dito que, mesmo ao lado da estação, havia uma campainha mágica que, se a tocasse, apareceria de imediato um empregado do Hotel que me levaria as malas. No entanto, como a estação e a vila são do lado esquerdo da linha atravessei e perguntei na bilheteira pela campainha. “Não sei nada de campainha, sei que o Hotel é do outro lado e vai ter que sair lá ao fundo e atravessar de novo”. Ele não estava muito bem-humorado. Aceitei, não lhe cabia a ele…
Voltei a atravessar, derreada, desesperada, eu que tinha escolhido este alojamento para não ter que andar com a mala de um lugar para o outro! Enfim…
A campainha estava lá, o empregado solícito veio, subimos e descemos escadas, percorremos compridos corredores e grandes salões e deparamos enfim com a recepção.
Foi tudo muito simples.
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