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Ia de olhos fechados, a cochichar para mim: isto é bonito! Isto é bonito… (desejando que fosse)!
Muito estimulada por recordações, pelo que não vejo no momento, abro os olhos, espio pelo canto da janela de vidraça fechada e vejo largos campos secos, já acastanhados que me deixam adivinhar um cheiro característico que não aprecio muito; longe, muros verde-escuro limitando campos e propriedades e, ainda mais distante, neblinas até ao horizonte. O céu povoa-se de nuvens muito trabalhadas, enroladas, amarrotadas, amassadas contra o azul (que eu supunha estar por trás), como se fosse massa tenra e murcha batida sobre a tábua.
De seguida, vi campos alagados com salpicos de verde, ligeiros relevos e imprecisos arbustos redondos, alguns fiozinhos de sol.
Não era nada daquilo que vislumbrara, quase adivinhara, quando com os olhos cerrados… E resolvi fechá-los de novo.
As sombras movimentaram-se rapidamente, na verdade, fugiram espavoridas e depois apareceu um cenário escuro e indistinto.
Estava era com sono e ouvia mais do que via, naturalmente, sons de vozes melódicas, dizendo e replicando sem fim.
Então abri-os em definitivo, os olhos, para a paisagem, agora iluminada por um sol já alto. E, sim, era bonito, não deslumbrante.
Havia o horizonte todo recortado de formas arredondadas contínuas, mais ou menos miúdas, as diferentes árvores dispersas nesse grande espaço entre mim e o longe, agrupadas ou alinhadas, esguias ou redondas, ainda cada uma com a sua sombra, nitidamente, a decorar a campina.
Talvez as árvores aparecessem e desaparecessem, conforme as necessidades do cenário, pensei. Distingui, pelas copas, figueiras, ciprestes… pouca coisa, casas alvas com telhados vermelhos aqui e ali, um moinho no alto, muitos espaços em branco…
Aprovaria mais e mais variados elementos, agenciaria isso com o Arquitecto, se pudesse falar com ele. E mais e mais componentes sedutores como ribeiros cristalinos, ecos, cantos de pássaros e bater de asas, constelações estranhas… que estimava incluir ali, o de que gosto. Porque tudo isto me diz respeito, nesta madrugada de Setembro, e posso escolher.
Porém, tudo se compõe e harmoniza e fica superior com o movimento, com o passar, a bem dizer, conheço isto muito sem conhecer bem, desejo fazer-me principiante de qualquer coisa.
Aprecio a região, mais descansativa que qualquer outra, ninguém em parte alguma, há silêncio e há calor e as poucas árvores foram gradualmente perdendo a sua sombra.
Com o tempo e tudo o mais a rolar, cinco horas depois do começo da viagem, é mais ordenada a planura, com pequenos montes dispostos de certa maneira… obra do tal Arquitecto de vistas largas… com linhas que se cruzam, se encontram, se afastam, diversas cotas, cores, texturas... O grande Arquitecto trata da organização deste espaço e do ordenamento dos componentes de que pode dispor.
Fez um projecto bem pensado, talvez tivesse levado em linha de conta uma sabedoria que ignoro e que o impediu de utilizar elementos inadequados a este clima, portanto, supérfluos, não estáveis, embora pudessem acrescentar beleza e música à paisagem.
Ele que é sensível teve de encontrar o ponto certo entre uns elementos e outros, entre os próprios e os impróprios, entre a estética e a utilidade.
Porque se vive ali… Contudo, o que saboreio é o momento de partir.
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