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Pensa-se muitas vezes que aquele que está só, não pode estar feliz porque sente a solidão como desamparo. Mas não é necessariamente assim.
Acontece que estou muitas vezes só e perfeitamente bem.
Sei que não estou abandonada, o que me levaria a um estado de mágoa e descontentamento.
Porém, há ocasiões em que simplesmente quero estar só. Necessito em absoluto disso, periodicamente, por temperamento, ou por circunstâncias de ordem social. Ou por força do trabalho que estou a realizar.
De qualquer modo e, mesmo neste último caso, não desejo estar só que não seja por tempo determinado e curto. O necessário. Ou cairia no receio da espécie de solidão que não pretendo.
Quero dizer, se não abandonei nem me abandonaram – não há razão para solidão e tristeza. Só que o trabalho é exigente, preenche-nos, queremos entregar-nos inteiramente a ele. E isso apenas é possível em silêncio e solidão.
Verdadeiramente, um escritor moderno, tal como o pintor abstracto, pretende e sonha criar uma linguagem nova, o que torna o seu trabalho difícil. Não se trata para ele de contar uma história – as histórias estão todas de há muito contadas.
É que o material que usa nas suas criações é o mesmo que toda a comunidade utiliza, é a língua que foi construída para que as pessoas comunicassem entre si e, portanto, todos conhecerão o código.
Se o escritor criativo deturpa a língua e assim escreve, ela torna-se indecifrável, não comunica. Ele apenas deturpou a língua, criou talvez uma língua nova, mas...
Será esse o seu prazer e o seu trabalho, a sua justificação.
Apesar de tudo, ele quer comunicar qualquer coisa que se acorde com a sua visão de um mundo desordenado e incompreensível que é o seu, no seu tempo, um mundo provavelmente em crise. E que decerto mostre mudança de mentalidades.
Como usar uma língua velha e conhecida que participa de uma cultura ancestral para uma escrita que só pode interessar se for uma linguagem fresca numa língua nova logo modificada, modernizada, deturpada?
Será um trabalho difícil e ambicioso que exige concentração, solidão e silêncio. Interior e exterior.
Irá surgir uma nova escrita pos-covid 19 que conservará um vago sentido conhecido que será um reflexo, uma recordação do antigo código da língua. Talvez com subentendidos e metáforas.
Haverá também um esforço de compreensão do leitor/conhecedor.
Chegaremos a compreender se nos esforçarmos.
É uma esperança de entendimento.
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