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Não me recordava de tempo assim, olvidara que assim fosse Abril.
Em certo momento, um pequeno arco-íris, um começo de arco-íris apareceu.
O céu fica pesado de nuvens em vários tons de cinzento. Mas o azul intenso está lá como fundo e de vez em quando assoma exuberante, límpido, profundo.
Seguidamente, desaparece o arco-íris, mas não a música que o lembra cantada por Judy Garland num velho filme de culto, somewhere over the rainbow. Essa permanece na minha cabeça com todas as suas branduras e feitiços.
O mar com algum movimento e ondas de espuma branca é cinzento escuro acastanhado, como se não quisesse ser visto e notado.
E volta o arco-íris, mais acentuadas as cores vibrantes.
É um cenário atraente com a passarada a cruzar muito acima, muito alto, como de costume para norte; e também para sul, reparo agora, possivelmente com destino apropriado. Pensam na sobrevivência, procuram o que comer – é um bom pensamento que sobretudo ocupa sem grandes cuidados, nesta beira-mar.
Somewhere over the rainbow…
Aqui o céu em Abril é excelente modelo para uma pintura contemporânea.
Saí para uma volta.
Subitamente, cai uma chuvada sobre mim, tomba sobre mim toda a chuva daquela nuvem mais negra! Será isto o próprio desta beira-mar na nossa cidade? Chuva repentina e, já agora, não-esperada por mim, sempre cheia de amor pela paisagem luminosa…
Tal como não revivo Abril, outros abris ou abriles (que esquisito), também me não recordo de não me recordar de maneira tão fechada, de como vim até aqui e donde vim.
Acho que posso imaginar que parti e cheguei, vinda do outro lado do horizonte que de há muito sobremodo me fascina, de pé sobre a água, de rosto para esta margem.
E de surpresa, estaquei, virei costas e mudei de perspectiva. Fiquei aqui a contemplar o brilho variável da água que reflecte o firmamento conforme a hora do dia, a estação do ano e os caprichos de vários elementos que se conjugam ou conflituam.
Sinto que surgi num dia de sol colorido de Inverno, deslumbrante. É justo ficar à espera, nesta época de alongado absorvimento diário e de contemplação, de uma revelação convincente. O meu desejo não é ver nesta preguiça actual das ondas cinzentas, com o sol longe a rasar a água quase parada, um mal disfarçado desalento dele que me transportou.
O meu anseio é reviver o que vi e vivi do outro lado, de onde me ausentei, de onde vim, como eram as pessoas que lá conheci… os rios… as cidades e as aldeias que amei e as outras, as que não amei.
Foi talvez uma longa caminhada.
Não sei se havia outras margens… faço um esforço para rememorar. Mas não sei. Ou sim havia. Escolhi esta.
Onde continua monótono, quase-sempre-igual, tudo. Um desencanto.
É o momento de ter saudades do que deixei por lá, radioso e colorido. (Mesmo que não saiba o que deixei vivido, mesmo que ninguém tivesse notado a minha ausência).
Há uma nostalgia. Pode haver um legado.
Quero voltar, abandonar esta mesmice, regressar às margens tintas e musicais de outros tempos. Quero voltar.
Como? dizei-me.
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