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A sedução do silêncio

por Zilda Cardoso, em 11.11.18

 

 

Hoje o Sol brilha sobre um grande mar de espuma de cor desconhecida. As vagas… não sei de vagas, sei de movimentos de espuma dispersos, irregulares, pedaços de ondas, que não sabem para onde se encaminhar. Ou é um mar que se diverte, em férias de Inverno.

Daí a pouco, o Sol deixou-se cobrir de nuvens e o deslumbrante brilho da espuma desapareceu. Murchou o mar. Está sem energia, sem alegria, sem habilidade.

Presentemente o espelho do mar é o céu. As ondas estão lá no céu, mas paradas, não cintilam, são outras, são de outra espécie. Só a forma se assemelha rudimentarmente.

Um dia para não olhar senão para dentro!

Porém, insisto.

A espuma recorta-se na areia, faz desenhos e avança, escorregando, arrastando-se e enfim desenhando a sua fronteira na praia húmida. Abraçara as rochas e avançara sem alarido, prosseguindo abatida… As rochas ficaram no seu lugar, serenas.

Todo o ar é cinzento e translúcido, a espuma finíssima volatilizou-se e, desse modo, acinzentou a paisagem como um vidro sujo, alterando-a.

O horizonte deixou de ser uma linha de separação, um fino limite entre o que posso ver ou me é dado ver e o que tento adivinhar. Está esbatido, não sei o que é assim vago, esconde mais do que revela, misterioso, cada vez mais.

Aprecio a lucidez mesmo quando é insuportável e não vou permitir que este texto se transforme num tédio de palavras ou  de imagens.  

Tenho visto esta cena, dia após dia, por muitos dias, a nevoa a cobrir tudo, a encobrir muito…

Sinto um esvaziamento… Como falar-lhes desta minha experiência da realidade tão cheia de nevoa, se não tenho palavras aliciantes para a descrever? Aliciantes, quero dizer, sedutoras para quem as ler. Que deem prazer.

Tento ocupar o meu tempo com pensamentos traduzíveis em palavras agradáveis e que signifiquem. E as palavras… devem adequar-se aos pensamentos, não servem quaisquer (já que é com palavras que construo os meus pensamentos).

Portanto, nem quaisquer palavras nem quaisquer pensamentos. Alguma originalidade é desejável.

Penso que as palavras surgem com os pensamentos não sem eles. Os pensamentos surgem com acontecimentos e… com o quê?

É possível afinal estar vazia de pensamentos, mas não quero estar.

Os pensamentos que exponho aqui são sinceros e são perturbadores. Esforço-me por dizê-los em palavras e fraseados que, quando saem sem graça, quando receio que não vão interessar alguém, quando repetem o que já foi repetido, me deixam muito inquieta.

É a única ocasião em que reconhecerei que o esforço não vale a pena. As palavras desejadas não surgem com coragem apenas. Talvez com o ou um desejo. E não é suficiente.

Assim, vou usar tão só o meu silêncio. Talvez a sedução esteja no silêncio, não nas palavras. E porventura também afinal em alguns pequenos ruídos do mundo, de asas e de cantos prováveis aqui à beira-mar, e de sussurros, de ecos …

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publicado às 16:40





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