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Ditador, precisa-se

por Zilda Cardoso, em 04.10.10

 

A democracia é muito penosa de viver. Quase tão penosa como a ditadura. Em certos momentos é mais. Na verdade… em muitos momentos!

 

Ao ver como se discute seja o que for, horas e dias e semanas, até à exaustão, sem aparentemente chegar a qualquer resultado, sem ver o fim das discussões, mas inventando a propósito dramas de todo o tamanho, contos e novelas com que as pessoas se entretêm… penso como teria sido agradável e proveitoso ter nomeado um déspota superinteligente e esclarecido, um génio, para nos dizer de que modo seria melhor para todos pensar, ver, agir. E que se executasse de boa vontade tudo o que ele dita, logo a seguir, com todo o rigor e tal qual ele ditara.

 

 

 

Vamos lá ver: arrisco-me a ser chamada fascista ou, muito pior, nazista nietzschteana, por exemplo,  mas é tão divertido imaginar um tirano, nascido e criado connosco no período democrático e criativo, escolhido por nós…

 

Eu explico: a vida política (pelo menos aqui neste Portugal, os outros depois copiariam) resumia-se a dois períodos pacíficos relativamente recorrentes.

1)    O da democracia

que é o tempo da criatividade, da confusão, das rupturas e da controvérsia sem fim.

Será um período em que sentimos que não precisamos ser independentes, resolver, decidir, ter o comando… sempre - sentimentos apropriados a este período em que o fundamental é pensar e descobrir e envolvermo-nos.

Andaremos enrolados nessas discussões que deixam qualquer um embaraçado quanto ao caminho a seguir, quanto à estratégia que é ardil, como se tudo fosse jogo de futebol que é preciso ganhar, e vamos apenas encontrar o caminho do interesse comum para o bem comum. (Que é o único que interessa, visto não sabermos viver senão em comunidade).

Até podemos encontrar a verdade, teremos participado nessa descoberta tal como aquele génio que vamos daí a pouco escolher como líder e que participa e surge do mesmo caldo de que nascemos (isto é importante repetir). A ocasião surge em que alguém esclarecido e preparado para tarefas de grande relevo e valor pensa por todos nós e executa ou manda executar, espécie de abelha-mestra de gigantesca colmeia para a qual todos trabalham.

 

 

2)    O da autocracia

que seria o tempo de governo de um, desse, com os outros a deixarem-se governar.

Esse seria alguém que tivesse processado no seu PCVP - …verdadeiramente pessoal - toda a informação obtida, sem desperdício, e que gostasse de governar e não de representar. Mostraria com a pompa merecida - não mais nem menos - o seu programa. De uma vez só.

O seu período de reinado absoluto será para os outros a pausa na governação ou na confusão, será a ambicionada descoberta da verdade e de outras coisas.

Se cada um de nós quer a todo o custo experimentar a verdade, deve saber que "cada qual tem uma verdade ao seu tamanho" e há as aparências, as sombras, as formas, as ideias... E também "verdades que só aproveitam àqueles que são capazes de participar na sua descoberta" (Agustina).

Pois.

É isso, nem sempre. Quase sempre.

Revelo agora um segredo: saberemos todos uma coisa fundamental quanto ao ditador, déspota ou tirano, autocrata, o que quiserem: não estamos, a população não está minimamente preocupada porque ele tem que ser eliminado ao fim de 5 anos, imperiosamente.

Essa depuração deve ser feita com regularidade, sem qualquer complacência. Para não haver dúvidas, mandamos cortar-lhe a cabeça como sempre faz a Rainha no País da Alice, sem que haja problema.

A interrupção é necessária em qualquer dos estados ou períodos políticos. É necessário passar de um para outro ciclicamente, sabendo que o que vem, o déspota escolhido vai começar o seu reinado mais à frente, vai começar um reinado que evoluiu no período do tumulto graças à contribuição de todos.

 

 

 

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publicado às 11:46


5 comentários

De Manuel a 04.10.2010 às 13:55

Com a crise que atravessamos presentemente, estamos a ser bombardeados de todos os lados pela controvérsia em torno do conceito de democracia. O temor de muitos, na verdade, refere-se às ameaças de novos regimes dictatoriais. Para muitos as ameaças já se tornaram perigos iminentes.

Hoje, a consciência política no mundo, inclina-se para um regime político dos menos imperfeitos, o regime democrático. Importa, por isso termos dele um melhor conhecimento.

Entretanto, ouve-se por todos os lados declarações e iniciativas que revelam tudo, menos compreensão do que seja a democracia.

Em primeiro lugar, importa dar-nos conta que todos os regimes políticos deveriam corresponder ao significado da palavra “república”. Ela tem origem no latim e significa literalmente “coisa pública”, pois “res” em latim significa “coisa”. E a “coisa pública” designa-se pelo bem comum. O regime político republicano, portanto, é aquele que está voltado para o bem comum e a ele dedicado.

A palavra “democracia”, porém, tem origem do grego e significa “governo do povo”, soberania popular, pois, a palavra “demo”, quer dizer povo e “cracia”, regime de governo. Neste regime o povo participa activamente, pelo exercício do voto livre e soberano, na designação dos órgãos de governo. Elege os representantes que melhor possam exercer a função de orientar todas as actividades sociais na prosecução do bem comum.

Entretanto, não basta que o povo exerça ou pelo voto, ou por aclamação, o regime de governo, delegando poderes em determinadas pessoas. Torna-se necessário que o exercício do poder seja desempenhado de tal maneira que o objectivo mais relevante, o bem comum, não fique frustrado.

Foi por isso que Montesquieu separou o « poder » em três órgãos distintos, cada qual soberano na sua função: o legislativo, o judicial e o executivo. Estes três órgãos devem por sua própria natureza exercer funções administrativas e, sobretudo, de controle.

A maior soberania deveria ser exercida pelas Assembleias Legislativas, cuja função define o regime como o do “primado da lei”, ao qual todos se devem submeter.

Não basta, portanto, dizer que se é democrático por ter sido eleito pela maioria, ou pelos representantes da Assembleia Legislativa. Se observarmos as ditaduras, todas elas se constituíram ou por votação, ou por aclamação popular. Hitler foi eleito democraticamente por votação. Lenine foi aclamado pelo povo. Fidel Castro igualmente, e não só pelo povo de Cuba que se livrava de um intolerável ditador, mas também apoiado por expressiva opinião mundial.

Por tudo isto, tem-se falado em ditadura da democracia, e os países reconhecidamente dictatoriais, ousam chamar-se de “Repúblicas democráticas”.

De Marcolino a 04.10.2010 às 20:03

Olá, querida Amiga!
Ao correr do teclado, apenas para lhe dar os meus parabéns, pelas duas belissimas fotos, feitas à mesma paisagem, do mesmissimo po.to, Uma de manhã bem cedo, e outra ao mergulhar do Rei-Sol, lá bem longe nas salsas águas, em busca do seu caminho de regresso!
Parabéns Zilda, pelas belas, e bem conseguidas composições!
Observar as leis da Mãe Natureza, fixa-las sequenciando-as, não só é Arte, mas também grande Criatividade ao demonstrar-nos que a luz do dia além da sua beleza, realça aquilo que nos parece sempre igual...!
Abraço
Marcolino

De Marcolino a 05.10.2010 às 11:54

Bom dia, Zilda!
Perdoe-me não comentar este seu belissimo texto porque, depois de o fazer, a Zilda ficaria a pensar de mim, e com toda a razão, desta forma: Aqui está mais um Lugar Comum...!
Abraço
Marcolino

De Isabel Maia Jácome a 05.10.2010 às 14:48

Querida Zilda
É engraçado o que suscita em mim quando a leio...
...um "ditador" feito à nossa medida, ao nosso jeito, que nos comandasse retirando-nos tanto deste árduo trabalho que recai sobre a sociedade civil e que a verdadeira cidadania exige...
...mas baralhamos e complicamos tudo, para não falar que, mais do que reflectir em conjunto e tentar que se trabalhe democraticamente para um bem comum, os homens resvalam na sede de poder e de ter... e cada um puxa a brasa à sua sardinha...
... não, não a imagino fascista, muito menos nazista e Nietzschteana... mas admiro a sua coragem de "pensar alto" e provavelmente nem se ralar muito com o que os outros possam pensar...
Dentro do muito que vou retirando daquilo que vou lendo nos seus postes e comentários, neste houve duas ideias que me ficaram mais marcadas e me apetece partilhar aqui consigo:
1)Em determinadas circunstâncias sabia realmente bem haver alguém de facto em quem pudessemos confiar e a quem nos pudessemos entregar por uns tempos, para que recolocasse "algumas muitas coisas" no lugar (e que bem precisavam)... com a pressa necessária ou a urgência que os tempos exigem e a situação pede, antes que nos afundemos cada vez mais e mais, ou de vez!
Alguém que o fizesse e não ficasse lá demasiado tempo... por isso a alternância que com graça propõe é brilhante e seria uma alegria e um descanso para muitos de nós, cansados que estamos desta palhaçada toda!...
2) A ideia de ir atrás de alguém... faz-me lembrar outro seu post em que correria atrás de qualquer desconhecido pronta a desvendar mistérios dos outros... mistérios que são curiosidades nossas, em momentos de reflexão enquanto vemos quem passa... e fez-me lembrar um episódio que vivi outro dia em Lisboa e que tem o seu quê de hilariante. Vou ver se lhe tomo o exemplo e ganho coragem para o contar um dia destes!
Espero que esteja melhor
Beijinho amigo
Isabel

De viguilherme a 07.10.2010 às 09:44

É sempre com prazer que retomo suas leituras que nos levam a viajar por momentos passados mas sempre presentes e daí reflectirmos e repensamos outos momentos por nós vividos ou a viver ......a saga dos Freudenthal tão bem descrita ....é sempre um registo de vivencias de um percurso de vida que nos leva a pensar a investigar e a reflectir neste evoluir da história da Europa ...suas contradições ,suas espectativas ,suas alianças .sua identidade e .....e.... sobre as minorias e ......sobre os ciganos e o contributo que a Augustina deu no seu livro .... lembrei-me dos " cem anos de solidão "de Garcia Marques ,onde o cigano Melquiades era quem trazia as ultimas novidades tecnológicas e sociais pois percorria um mundo no mundo.....que levava aos senhores do mundo .......momentos estes de pensar e meditar ......

As fotos e os textos de um Porto que será sempre um porto ajudam a melhor entender a cidade e suas gentes .....

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