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A VIAGEM

por Zilda Cardoso, em 27.07.10

Queria fazer uma última viagem no sentido que Agustina dá ao termo viagem.

“A viagem com o seu mistério e a sua intimação à consciência, com as suas alegrias que nascem inexplicavelmente dum golpe de vento na poeira sobre uma ponte, duma sensação de vida isolada e profunda quando atravessamos uma terra estrangeira – ah, essa viagem poucos a podem experimentar!”

Experimentei vezes sem conta e é disso que tenho saudades, é isso que desejo tentar uma vez mais.

Recordo pormenores daquela ao Japão; e da outra ao México sobre as quais escrevi ainda no calor do que admirei. Foram também perfeitas as viagens à Índia dita Portuguesa, à Turquia e a lugares inteiramente diferentes como a algumas ilhas da Polinésia, à Ilha Maurícia, aos Estados Unidos, e a muitos lugares de quase todos os países da Europa.

O que encontrei em qualquer destes lugares tão dissemelhantes?

Não sei o que descobri. Sei que me davam um prazer enorme essas viagens sem muitas marcações prévias, os detalhes desconhecidos e insignificantes que ia descobrindo, essa beleza das coisas simples e ignoradas de que não dava conta no meu dia-a-dia apressado e desatento nos lugares habituais. Divertia-me analisar os gestos de pessoas estranhas, adivinhar as intenções, imaginá-las na sua vida grandiosa e simples. Nos seus dramas, facilmente arquitectados por mim a partir de um trejeito ou de um acenar, adivinhava inteligência e perseverança e muito mais. Como melancolia. Ou imprudência, talvez.

O que me ficou foi o prazer das descobertas que mais ninguém fez, apenas porque não tinham valor para ninguém. Aquela música em certa catedral gótica à luz dourada do fim do dia que inesperadamente me agarrou e me levou para um mundo outro… O modo como passei as barreiras para o lado da New York não recomendável, feliz e inocente, consumindo à colherada um enorme e saboroso iogurte que levava na mão, com o dobro do tamanho dos nossos e o doce de fruta no fundo para misturar apenas o que quisesse, calculando que ninguém me faria mal e não fez. Ou nem sequer pensava nisso. O espanto de ver a senhora velhinha, impecável nas suas roupas esbatidas a condizer com o cabelo branco, a apanhar com desagrado, claro, qualquer minúsculo papel que alguém deixava cair ao chão, conspurcando a sua cidade limpa… E o ter podido conviver com o importuno, como diz Agustina, no para mim mais interessante dos seus livros, Embaixada a Calígula, que acabei de comprar pela segunda vez, agora na reedição de toda a obra.

Termino lembrando palavras de Kierkegaard, citadas nesse livro:

“Quando alguém escreve acerca dos acontecimentos da sua própria vida, é regra de delicadeza não dizer nunca a verdade, mas reservá-la para si e permitir só que se reflicta de diversos ângulos”.

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publicado às 21:39


5 comentários

De Marcolino a 27.07.2010 às 23:41

Boa noite, Zilda!
Obrigado pela sua Viagem, às suas viagens...!
Abraço
Marcolino

De Pu-Jie a 28.07.2010 às 10:01

pois por isso, o meu primo Luis Bernardo tanto me ajuda a conseguir escrever acerca dos acontecimentos da minha própria vida...

De Augusto Küttner de Magalhães a 28.07.2010 às 10:55

Muito agradável esta panoramica que nos quis dar de algumas viagens feitas, do que viu e do que sentiu, pelas Pessoas locais.

Espero que agora seja o momento de projectar novas viagens, a novos ou aos mesmos locais, para com a exactidão que tem nos actualizar sempre mais!

Augusto

De Joice a 25.06.2013 às 01:28

OI minha dica é ir pra Praia do Rosa no inverno tambem visitar as Baleias Francas que ficam amamentando seus filhotes
em torno de julho a outubro , reservas de pousadas e casas podem entrar no Portal http://www.praiadorosa.blog.br (http://www.praiadorosa.blog.br)
Valeu pessoal boas fotos.

De Zilda Cardoso a 25.06.2013 às 08:23

Muito obrigada pela sugestão: talvez um dia...
Qual é a melhor época para essa viagem?

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