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Não temos de

por Zilda Cardoso, em 16.07.09

 

Talvez o musgo verde misturado com sal que borda as minúsculas lagoas sobre as rochas antigas esteja mais espesso; talvez haja mais sal noutras que já secaram e sobejou o sal, talvez as cores das metamórficas se tenham alterado ligeiramente. Ou seja erro meu.
Estou quase em cima do mar que se afadiga formando ondas de espuma rendada, é contra as rochas que ele está, não com raiva mas com bom humor. Acarinha aquelas mais pequenas, acho que as convida para uma brincadeira.
A minha roda é tão linda, mata a tira lira lira… a minha mais linda é, mata a tira lira lira.
Dai-me uma menina (ou uma rochinha), mata a tira lira lira… qual escolheis vós?
Estão tão pregadas no solo que não se dão por nada. E é o mar que acaba por se retirar, talvez amanhã…
Passeio sobre as rochas acastanhadas que simulam torres de castelos medievais, passo à praia formada de conchas estilhaçadas e brilhantes e de areia vermelha. Há um pássaro redondo e verde, minúsculo, que desaparece mal me vê e pessoas que caminham tranquilamente ou com pressa ou correm como se não houvesse tempo, como se não tivessem tempo, como se o tempo não fosse um bem a desperdiçar!
Por que haviam umas de ter tempo e outras não? Aquelas  supostamente correm porque têm de.
Não compreendo que inventássemos coisas que têm de ser feitas, que têm que ser pensadas, que têm de ser ditas, e infernizemos a nossa vida porque essas coisas são árduas; no entanto, ninguém nos deu ordem de fazê-las, ninguém com autoridade. Não encontro quem tenha o direito de mandar coisa alguma. Somos na realidade seres solitários e teremos de resolver, nesse estado, os nossos problemas universais. É a única coisa que teremos de.
Se quiser, fico aqui eternamente e ninguém me pode impedir. Sofro e gozo as consequências, mas ninguém me vai dizer que não é aqui o meu lugar, que este mundo não me pertence e que tenho de… tenho de... e depressa, depressa.
Não quero mais ter de. Estou farta de ser enganada, compreendo que tudo é ficção.
Aqui em frente do mar, nesta manhã radiosa, digo a toda a gente que nunca mais tenho de.

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publicado às 13:47


11 comentários

De Marcolino Duarte Osorio a 16.07.2009 às 15:46

OLá, Amiga Zilda!

Citando-a: «Aqui em frente do mar, nesta manhã radiosa, digo a toda a gente que nunca mais tenho de.»

Completaria siim: Ser virtual...!

Resto e uma belissima tarde de veraneio!

Marcolino

De Maria João Brito de Sousa a 16.07.2009 às 16:06

:)Não "tenho de", mas devo dizer-lhe que gostei muito de ler este seu "statement".
Um grande abraço!

De CC a 16.07.2009 às 22:46

"Sofro e gozo as consequências, mas ninguém me vai dizer que não é aqui o meu lugar..."

E não me é nada díficil imaginá-la nesse lugar a caminhar sobre as rochas acastanhadas que fazem lembrar torres de castelos.
No Domingo de manhã estive na esplanada do Tabi, a manhã estava fantástica e o mar um espanto, calminho e azul, de repente, a propósito de nada digo:
- Aquelas rochas são metamórficas
Perguntaram-me:
- Porquê?
Respondo:
- Porque a Zilda diz que são.

Fique bem!

De Zilda Cardoso a 17.07.2009 às 09:10

Tem muita graça, CC, e eu fiquei desvanecida. Lembrei-me que tinha escrito um post sobre o Passeio Geológico da Foz, mas não o encontrei. Penso que continua a haver regularmente uma visita guiada às famosas rochas nossas vizinhas. E só é necessário telefonar para a Câmara para ser informado do assunto. E tb há, ao longo da esplanada, diversos "outdoors" com fotos destes locais bem sinalizados e informações e explicações sobre as rochas.
gostaria tb de dizer-lhe que tl tenha interesse visitar um m/antigo blog onde por pouquíssimos meses escrevi e de que quase me tinha esquecido. O endereço é
http://zildacardoso.blog.pt

De CC a 18.07.2009 às 18:18

Zilda, já estive lá e hei-de voltar.
Li a sequência toda sobre o silêncio, essa coisa que às vezes é tão bem vinda, as histórias do Porto e a triste história de Joana.

Assisti ao nascimento do fio de Ariadne mas desconhecia o anterior blog, igualmente bom e de muito interesse. Vou ler todos os textos.

Um bjnh

De Augusto Küttner de Magalhães a 16.07.2009 às 22:50

Tentei seguir o racicionio, tentei ver-me a passear ali junto às rocha, tentei pensar que "não tenho que...", talvez já "tenha tido mais tenho que.." que hoje, mas mesmo assim " ainda tenho muito que...", caso contrário não estou cá....não me deixam...entro noutra orbita, saio e salto fora!!! tenho que....

De Romina Barreto a 17.07.2009 às 18:46

Querida amiga, li este seu texto com muita atenção, sempre atenta nas entrelinhas e acabo por perceber a importância que é desfrutar os momentos, ter tempo e assim tudo sai mais engraçado e divertido e acima de tudo, genuíno. Gosto mais quando as coisas não são feitas sob pressão mas sim espontaneamente.
Tudo isto também para saber que estou sempre aqui, on-line com o seu blog. Abraço.

Romina

De concha a 18.07.2009 às 12:01

Fez-me tanto sentido este post!
É óptimo quando a vida passa a ter outro sentido, porque deixamos de ter de.
É então aí que nos apercebemos que correr não é importante ,porque o tempo que usamos é simplesmente aquele que queremos usar.
Talvez seja também estarmos numa comunhão tal com o que nos rodeia, que só passou a ter sentido o essencial .E para o essencial da vida há sempre um tempo com tempo.
Um abraço com a gratidão de sempre pela partilha do seu sentir.

De Zilda Cardoso a 18.07.2009 às 18:58

"... só passou a ter sentido o essencial". É exactamente isso, muito obrigada, Concha.

De concha a 19.07.2009 às 00:29

Eu é que estou grata à Zilda , por me fazer pensar em aspectos tão importantes da vida .
Acrescento só ,que este sentido do essencial é dinâmico , o que obriga a uma atenção redobrada para manter o pretendido .

De Primavera a 21.07.2009 às 13:47

O mundo do "ter" e as suas servidões.
O "ter de" e as suas obrigações...
Só o "não ter " nos torna livres!

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