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Recordo a Amiga de quem mereci estima, apreciação, respeito. E também a Escritora que admiro.
Tenho muitos dos seus livros na estante em frente a mim, nunca a perco de vista. Mas o que mais recordo e melhor são os seus pensamentos inteligentes, a sua boa disposição, o sorriso sempre acolhedor… E, do mesmo modo, as cartas, as mensagens telefónicas, as confidências, a sua companhia…
É do que tenho saudade.
Zilda
Viver entre azuis
sem nem uma nuvem
entre mar e céu.
A vela branca e eu
deslizando…
Alguns fios de sol
perto do horizonte
lúcido e longínquo.
Gaivotas brancas
recortadas no azul,
um som suave e morno…
A vida a acontecer
entre céu e mar
Aqui.
Não temos qualquer experiência do nada.
A morte é o nada.
Não temos experiência da morte porque a morte é o nada.
Não sabemos o que é o nada, não conhecemos a nossa morte. A não ser que é o nada e porque calculamos, embora nos custe a aceitar, calculamos que não fica qualquer recordação da vida, do que foi existir, até ao momento da morte.
Até ao momento do nada.
Vê-se o mar, o porto, a praia dos surfistas e a outra… extensa.
Ontem apreciámos tudo isso devidamente, da sua varanda. Mas não vimos o Sol no seu esplendor antes de desaparecer, dourado e brilhante no horizonte, ao fim da tarde.
O ouro encareceu no mercado com recentes acontecimentos belicosos e, talvez por isso, não abrilhantou nem enriqueceu o Astro como noutras ocasiões, frequentes, em que alguém é calorosamente convidado para o admirar de longe, da varanda. A certa altura, enfiou-se na barreira espessa de humidade cinzenta, justamente uns centímetros acima do horizonte, e ninguém mais o viu.
Então, a minha amiga convidou-nos para nos refrescarmos com o seu alto e belo copo borbulhante e também dourado, que esse sim manteve a promessa, entre as salsas e as hortelãs verdes e bem-cheirosas dos vasos e as flores sofisticadas que crescem na varanda e sorriem para nós todo o tempo.
Gosto do sorriso delas, até que murcham. Dão-se alegremente: é um regalo contemplar!
Daí a pouco e inesperadamente, estávamos na sala de jantar perante uma mesa requintadamente posta em frente ao porto que podia ser Manhattan mas era muito mais bonito e próximo. E havia os barcões brancos de turistas, muito esticados ao longo do paredão, e que ali tinham pernoitado para a programada visita à cidade.
Como podíamos não estar deleitados? Cantámos canções da nossa juventude, napolitana e grega, nórdica e alentejana e minhota e beirã, tudo em poucos e alegres minutos…e eu disse, a pedido, e muito mal, um poema do meu recente livro…
Foi uma reunião totalmente conseguida, alegre e original. Apenas se falou de música, de amizade e de arte. Que melhor?
Bem rodeados estivemos na sua varanda, estimulados para pensamentos benévolos, não fez falta aquele outro brilho precioso dispendioso, de mercado.
Há muitas coisas que me esforço por realizar bem.
Nem sempre consigo. E ralo-me. Mas há outras - muitas - com que não me importo, realize bem ou mal, Não quero saber..
Por isso, muitas das coisas em que penso quando contemplo o mundo da minha varanda é que talvez aquilo que nesse momento me está a preocupar pertença afinal ao grupo daquelas coisas com que não me importo, de que não quero saber.
E fica tudo bem, confortável, saudável.
(Descobri esta semana esta nova e extremamente confortável maneira de ver a vida.
Felizmente, não estou só, sozinha e solitária. Há no mundo outras entidades de grande porte e valor, relevantes como a Lua, o Sol, diferentes astros ou estrelas.
Dou-me bem com eles, vejo-os quase todos os dias, conversámos.
Não sei o que faria se desaparecessem. Achar-me-ia desamparada.
Vejam só a minha sapiência. (Já lhes contei como o Roland Barthes define sapiência e escrita moderna?)
Aquela ideia de que estou com o Sol, com a Lua, com outros planetas enche-me de uma segurança enorme, pois não é fácil que vão desaparecer todos e deixar-me para trás, alone. Por isso, me sinto acompanhada e cheia como um boneco insuflado de coisas boas e resistentes.
É claro que se aproximarem de mim suficientemente um objecto picante… eu posso esvasiar subitamente. E lá se vai a confiança em mim própria: fico despida por dentro. (Por fora… não sei).
Acto que a minha escrita revela e que R. B. chamava sapiência. É o que penso aproximar-se da realidade do que escrevo.
R.B. falava de uma escrita moderna que de certo era do seu agrado e que revelava ausência de poder, apenas um pouco de saber, alguma sabedoria e o máximo de sabor possível.
Como apreciava chegar lá!
Ultimamente, tenho andado a inventar uma vida…
Mas sempre tive uma vida! Só que nunca foi, antes, e continua a não ser, a que gostaria de ter. Ou como me agradaria que fosse.
Todavia por que não a fazer do meu agrado? Pois… depende de mim. Posso fazê-la má e, de qualquer modo, inventar uma satisfação para ela, quero dizer, posso pensar que ela é satisfatória e me preenche assim mesmo, tal qual é.
Posso construi-la como quiser e entendê-la como pretender. Nem sequer são superioridades minhas: esse modo de viver, essa vida ou a minha satisfação dela, sem limite, dependem da minha escolha, e isto é igual para toda a gente.
Posso considerá-la do meu agrado, por exemplo, sendo solidária para com os outros, que são meus iguais. Ajudas recíprocas para que estejamos todos bem. Nós e o mundo.
Sem guerra (sem vencedores e sem vencidos).
É uma ideia que pode resultar.
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