Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
O mundo é verde, visto daqui, da minha janela. Todo verde.
Não “uni”, não liso, mas de muitas tonalidades que se adequam a formas diferentes.
Cada tom corresponde a uma forma e há uma quantidade infinita de configurações distintas.
O meu pensamento tem muito que elaborar e reflectir antes de sair deste tema.
Aprecio os verdes iluminados e os que têm luz própria. Estão aqui, ali, acolá… cumprindo o seu papel. Há os de luminosidade média e os escuros. Entre uns e outros, quantos tons e quanta beleza!
Misturam-se com castanho esverdeado e com quase branco. São árvores, arbustos, frutos, nunca deixam de todo de ser verdes. São de longe ou estão perto. Fecham-se a 30 metros e parece não haver nada para além.
Este é um mundo pequeno e frágil, sem espaços em branco.
O silêncio só eu o ouço. Calculo que haja pequenos ruídos e cantos e risos. Possivelmente choro e lamentos. Não ouço nada disso.
E, por essa razão, julgo que é um mundo passageiro, não é para durar.
Alegra-me pensar que o comum e trivial não entra aqui; apenas o natural e simples e quase transparente. Não há lugar para a mentira, apenas saberes limpos. Talvez, por vezes, afinal se possa escutar uma certa música levíssima que me tranquiliza.
Por isso, continuo a olhar pela janela, mesmo depois de deixar de olhar.
É bom estar aqui.
Depois de meses enfiada em casa, saí hoje cheia de ânimo para uma volta a pé, sem outro desígnio que não fosse...
Ora bem, de maneira nenhuma me satisfez. Para deambular? Para fazer ginástica? Para ver mundo? Tudo isso é possível a partir da minha impensável varanda-de-ver-o-mar, de que já tenho falado. Ou lá mesmo.
De modo que voltei para casa e com maior denodo ainda, montei o carro e fui por aí fora poluindo… poluindo, mas clareiras abrindo. Na minha mente.
Parei no simpático Jardim do Calem, onde faria jeito ter a máscara sanitária muito posta. Ou não.
Decidi tirá-la.
Os meus amigos patos andavam por todo o lado. Gosto de os ver, apreciar a sua forma de andar muito sexy e de namorar, a insistência ou o assédio deles que são lindos, elegantes patos reais e convencidos. Elas são tão feiinhas, mas não importa, vai continuar a ser assim até ao fim do mundo.
Mas quando tirei a máscara, compreendi muita coisa. O cheiro era de mais, o cheiro fétido da água da ribeira da Granja!
A máscara cumpre pelo menos um papel que é enorme. Com ela, não havia aroma maléfico. E eu vou passar a usar sempre máscara para evitar aqueles odores.
(E onde dissolveremos para sempre ou queimaremos os artigos e os vírus inteligentes que provocam os maus cheiros, as doenças e os outros problemas que dão cabo das nossas vidas?)
Há alguns anos, respondi assim às perguntas de um jornalista:
Não tenho nada de que me orgulhe especialmente, por mais que procure.
Claro que não sou totalmente destituída de qualidades boas.
Sou sobretudo sensata e dotada de uma certa inteligência emocional (será esta a palavra? não se percebe bem o que escrevi ou gatafunhei…)
Penso que sou equilibrada nas minhas decisões. Normalmente não me apaixono, não sou de excessos. Não sei se é uma qualidade.
Sou ou pretendo ser sincera e simples. Procuro isso nas crianças, aprecio que sejam crianças e que os adultos com quem convivo não deixem de todo de ser crianças. Busco isso em mim, se bem que, por outro lado, seja muito racional e lógica.
Não me deixo levar na voragem dos sentimentos.
Também sou muito tímida, não deixarei de ser, mesmo considerando quanto isso me prejudicou a vida toda em termos de estatuto e de carreira…
Embora agora lamente não ter sido mais empenhada, por exemplo, como escritora ou escriba ou como galerista de arte e design, sempre preferi ser várias coisas ao mesmo tempo, desempenhar vários papéis.
Posso talvez, POSSO? orgulhar-me disso mesmo, mas o que significa tal coisa? Assim nunca pude ser excepcional, porque não era possível (reservado aos génios). Não fiz nada bem, como poderia ter feito se não considerasse redutor querer desempenhar um só papel.
Então talvez me possa orgulhar disto, finalmente. Será, como diz, um não-orgulho completado pelo outro não-orgulho – o de não me orgulhar disso.
Estar ou viver só, facilita muito a resolução de inúmeros problemas, mas não é forma de viver. Não é forma aceitável de viver, porque viver (pelo menos para os humanos) é sobretudo viver com, conviver.
Há muito que não sabemos viver doutra maneira.
Sem dúvida, facilita na questão dos contágios. Se não estou com ninguém não posso ser contagiada nem posso contagiar. E isto vale para todo o tipo de contágios - bons e maus. Permanecemos imunes.
Mas por razões que verificamos estarem certas, não podemos viver apenas de ar puro, não conseguimos, não chega. Preferimos ar puro ao poluído, mas precisamos de outras coisas. Como água pura, alimentos puros que preferimos aos contaminados, é certo. Pensávamos ser melhor para a saúde.
Não queremos tocar em superfícies contaminadas nem no que quer que seja infectado por coisa má. Porém, interessa-nos tocar em alguma coisa. Queremos água e alimentos simples, respirar ar mesmo menos azul e um pouco mais poluído, sofrer a ventania da beira-mar e o sol que nos queima e nos pode ferir de quase-morte.
Queremos ou quisemos estar sujeitos ao mundo que criámos e queremos, sem dúvida, QUEREMOS, parar agora para pensar.
O que vale a pena e o que não vale. Saber se é preciso destruir com grande sofrimento, não digo de inocentes porque todos gozamos e sofremos o que nos destruiu…Queremos saber se é preciso destruir tudo o que construímos e parecia fundamental… Se afinal o que realizámos não era fundamental…
E se vamos ter que construir doutra maneira ou de forma inteiramente nova a partir de novos materiais de toda a ordem.
Mas talvez em conjunto, (que divertido!), sem máscaras, sem luvas, sem distanciamentos, sem fingimentos. E sem medo.
Como semelhantes.
Para isto, temos que começar do zero?
De que forma podemos COMEÇAR?
O que será um novo ponto de partida para nós neste planeta?
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.