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Tento juntar num só pensamento tudo o que pensei nestes dias de fim de Verão.
Os reflexos na água, medito neles, como no calor de sempre, na brisa e nos nevoeiros, nos movimentos da praia e nos ruídos dos carros quando se vão e não voltam. Os pores-de-sol dourado que “esses” que não voltam já não vão apreciar.
Reflecti na subtileza dos perfumes...
Haverá apenas um perfume que se liga ao sol dourado e quente do fim do dia? Ou é o mesmo todo o dia?
Um só perfume…
Acho que não saberemos distinguir diversos odores e sonhá-los. Nem mesmo no fim do dia. Nem sequer no fim do Verão.
De resto, pode sonhar-se um perfume?
Talvez um… sim, se for único.
Não… não. Perfumes e sonhos… são naturezas de ordem diversa.
Qual era a minha ideia?!
Estou p´ra’qui a não pensar em nada, a não fazer nada…
A ver o nada à minha frente - é o que sinto - o vazio, as paredes nuas… E à distância o mar, o céu alto, a esplanada com jardim sem cor, sem cores e sem bons odores...
Prossigo: não sei o que fazer, o que pensar, não sei pensar, só olhar, encho os olhos... Busco ideias aliciantes que não sei onde são nem onde pesquisar e que procuro sem saber como procurar.
Com tanto a ser feito por aqui! Tanto ruido estridente e movimento, carros e máquinas de todo o tamanho por cima dos passeios e nas faixas de rodagem, tantos homens escuros a rondar, a dar ordens…, nada me assiste ou me inspira, nada se parece com a musa.
Pousar um pouco talvez seja útil.
Tentar conhecer as histórias dos outros para inspiração é uma primeira ideia.
Mas foi de Apolo que me lembrei, de súbito!
Apolo, Deus solar que terá residido nesta zona todo o Verão, brilhante e acalorado, "sobre as sombras que roubam aos humanos o conhecimento" é suposto projectar claridade.
Muito bem, é disto que preciso: claridade, discernimento.
Deus poeta e músico, Apolo, o Sedutor, liga-se ao bem-estar, à plenitude. Podem, no entanto, os seus raios maléficos ser agentes de destruição!
Aceito-o e invoco-o como símbolo da ordem universal, encarnação da harmonia, Musageta ou condutor das Musas.
Talvez volte a escrever, enfim.
Esta manhã, pelas 6, tive a sensação de que o Sol se enganara, iria nascer no lado oposto exactamente onde é costume pôr-se e desaparecer até ao dia seguinte.
O que havia nesse lugar era uma Lua iluminada que espelhava a sua luz no mar, dourada e serena, confiante em si… Como vai ela desaparecer, contando que é quase dia?
Tem de se esconder não sei como nem onde.
Entretanto, o Sol nascerá do outro lado, tal como tenho visto desde que dei conta que existia. Confio nele.
A Lua enterra-se em nuvens e nevoeiro aos poucos. Assoma como meia-laranja e mesmo como esfera dourada. Aparecem interessantes figuras desenhadas nela.
Que Lua tão divertida!
Ainda não vi o Sol, no entanto, misteriosamente o dia vai ficando claro.
No mar, um barco branco dirige-se para o porto que ainda se ilumina artificialmente de amarelo, azul, vermelho. Fica ao largo um pouco, sem ordem de entrar.
E, pronto, aí está ele deslumbrante e esplendido depois das 7 horas, radioso, dourado, risonho, o Astro. Tudo fulge agora.
No entanto, a Lua, um bom pedaço dela, ainda é visível do outro lado, meio mergulhada em nuvens.
Há um jogo entre eles.
Todavia, o dia estava feito.
Tive uma experiência fascinante: foi parado o nosso tempo comum num certo lugar nesta cidade, ontem, e inserido, por meio de ritual apropriado, um tempo sagrado.
Na realidade, foi um intervalo no presente histórico.
O tempo sagrado, repetível e recuperável, sempre o mesmo, é reactualizado todos os anos nesta data pela Festa.
Acontece um “eterno presente”! Por instantes, convidados e festejada vivem, vivemos um tempo primordial, aquele em que é possível estar na presença dos deuses, comunicar com eles, repetir os seus gestos…
Antes, sentíamos a nostalgia da perfeição dos começos. Por isso, a Festa foi importante: contemporâneos dos deuses, reintegramos o tempo sagrado e perfeito da origem.
Não encontro outra explicação para o que senti.
As línguas faladas pelos presentes foram - Português, (vagamente), e Inglês, Italiano, Grego, Dinamarquês… provavelmente outras. E também uma divertida e babélica amálgama de todas essas.
Cantaram-se os parabéns nas cinco línguas e a aniversariante apagou as velas outras tantas vezes, multiplicando desse modo o número de anos ou induzindo em erro os desatentos. Fosse como fosse, ela estava linda, risonha e muito mais jovem do que a repetição deixaria supor.
A presença do marido deu à Festa um valor único e inesquecível. Houve temperança e solenidade.
Regozijo-me por ter podido participar.
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