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Falei do mar, mas há também o céu que igualmente contemplo da minha janela.
Eu sei que há céu por todo o lado, mas aqui, é diferente. Porque este reflecte o mar tal como o mar reflecte o céu. Por isso, um e outro, se bem que díspares, são neste lugar, para mim, fonte de emoção.
No momento, há barcos à vela, minúsculos, navegando a sua tranquilidade por aqui, por este mar.
Que não mostra barcos reflectidos, mas vagas nuvens brancas bem desenhadas.
E à noite, é comum o céu apresentar estrelas cintilantes que o mar hábilmente reflecte.
Verdadeiramente, o que mais aprecio é a linha que os separa. É essa que me apaixona. Às vezes, é pura, sem névoa e sem interferências. Outras, com interferências, mas sempre deixa passar os barcos mesmo enormes, até gigantescos, para o outro lado, para o desconhecido.
Fico a pensar no que vão descobrir, gostava de ir neles para mares nunca dantes navegados como fizeram no século XV e já antes os meus antepassados. O que quer dizer que ajudaram a construir o mundo ou a dar forma a mundos que já existiam.
Mares…?!Se é o que há do outro lado da linha horizontal…
Haverá também terras desconhecidas e povos insólitos e costumes extravagantes. Haverá tantas coisas boas e bonitas e úteis…E também possivelmente o que é leviano e fútil e frágil.
Não quero saber disso.
Preciso de ver, quero conhecer. São de certeza factos radicalmente inesperados que me agradarão ou não. Novos, enigmáticos, luminosos ou transparentes. Acontecimentos com força sedutora capaz de incendiar o meu pensamento, torná-lo vivo e fecundo.
Irei com os novos descobridores.
E estes escritos são para, antecipadamente, louvar a glória daqueles com quem terei embarcado.
Agradeço… ter capacidade para apreender a beleza do mundo. Pelo menos, do que vejo da minha janela.
E é
sempre o mar e o seu brilho suspenso, a cor, o movimento elegante e ondeante e lúdico, as rendas muito brancas, a dança e a música que cria e não é mais ruidosa do que a das bandas rock pop muito contemporâneas. Vê-se a certeza e a segurança em si próprio, a desenvoltura…
Depende dos outros elementos, mas sempre a sua vida tem um ritmo apropriado, adaptado ao que acontece no momento. Dependente/independente nunca merece apenas um desses adjectivos.
Não sai grandemente do lugar, volta sempre ao lugar. A este, entendo eu. Rapidamente, e para meu regalo, atira-se para a frente de braços abertos, vulnerável, recua com tranquilidade e volta… volta… enquanto lhe apetece. Cada experiência quotidiana é uma novidade radical.
Deve ser um jogo infinito que não se explica, que ele não explica e me lembra o de certas aves quando abrem e exibem a plumagem em leque, pavoneando-se para seduzir. Ou como frases emplumadas concebidas para o mesmo efeito.
O mar é exemplo de bom comportamento, desprendido, mesmo quando se conduz mal. É tão impulsivo e veemente e intenso ou talvez apenas cheio de vivacidade e simultaneamente delicado e suave! Como um felino.
Sabe que tudo lhe é permitido porque possui querer e valor.
Qualquer novidade tem características interessantes - mesmo que seja o que chamamos má notícia ou novidade má. Por ser novidade é diferente. E como diferente é inesperado e dará gosto conhecer.
O que acontece pela primeira vez traz mais benefício do que o que é repetido. Se houver curiosidade, que é muito diferente de bisbilhotice, pode levar a um conhecimento sério, a um melhor conhecimento.
Mesmo a linguagem fica antiga a partir do momento em que é repetida, diz Barthes.
Sem dúvida, estamos sempre a repetir palavras. Em princípio e porque temos o desejo de comunicar e de nos entendermos uns com os outros, temos de repetir as palavras que toda a gente conhece, o que aprendemos desde o berço, senão como nos entenderíamos? Falando a mesma língua, não é verdade?
Parece ser possível que a repetição dê fruição, mas não é comum nem é o meu caso, não é o caso das pessoas que melhor conheço. Por vezes, desperto de manhã com um ritmo repetitivo excessivo, uma música encantatória que se repete na minha cabeça e não consigo calá-la: dá-me cabo do entendimento… E ando todo o dia naquilo, repisando a litania enfadonha que talvez se repita no dia seguinte, ultrapassando o que contei como intervalos de teatro ou da vida em que nada acontece.
Ninguém tem nada com isso, apenas eu, não é? Só me incomoda a mim. Sofro, não tenho nenhum prazer.
O que acontece na televisão é que é vergonhoso: repetem-se sem fim conteúdos e esquemas ideológicos, repetidos em diferentes canais e programas, variando apenas as formas de apresentação... que são superficiais. O sentido é sempre o mesmo.
Esses programas não têm nada de inovador nem de imprevisível e a linguagem que usam é estereotipada ao infinito.
Seduzirão a maioria dos espectadores? Só aqueles que por razões de saúde e outras não têm diversa forma de entretenimento.
A televisão é um meio privilegiado de aprendizagem seja do que for, por isso, faz pena que não seja aproveitado devidamente. Quero dizer, também com um fim cultural um tanto superior.
Não posso deixar de pensar que o que é apresentado é um abuso: é um considerar que os espectadores não merecem mais.
E que não vale a pena.
De súbito, parou.
Fez-se silêncio profundo.
Eu... fiquei maçada, diria, pisada! Achei que tinha direito a algum ruido, a certa companhia. Por que haveria de ficar assim só?!
Foi a chuva que estacou, deixou de bater nos vidros, é o vento que já não assobia irritante nas frinchas das portas e das janelas…
É todo o exterior que conheço e que regressa com renovada tranquilidade, outro.
Podia ser esta uma boa ocasião de conversar um pouco comigo, seriamente. Ou de termos um diálogo com piada, quem sabe. Eu e eu.
Mas não era bem o que queria hoje.
Vivo a minha idade média. Não aquela ou como aquela que estudei - período muito longo da História Universal com características não de todo brilhantes - mas como uma outra mais próxima da verdade e da realidade.
Pensa-se agora que a Idade Média terá sido um período não medíocre nem obscuro, mas um de surpreendente borborinho intelectual. E de acontecimentos de importância transcendente, descobertas e invenções sobre que foi necessário meditar.
E alterar conceitos acerca do mundo.
O borborinho ocorre-me também, a mim, nesta ocasião da vida. Por essa razão, a minha idade média é esta, é uma só, não a entendo como sombria.
Não consigo dormir todas as horas de que disponho para essa ocupação exaltante; e então… penso. Tento pensar em coisas vertiginosas que descubro ou invento e ficam como projecto para o resto do dia ou dos dias seguintes, futuros próximos.
Que vão ser radiosos e transformar a minha vida e a dos que me acompanham numa coisa luminosa, permanente fonte de emoção, mas não de lutas.
Creio que a minha atitude tem de ser solta e desenvolta, sensível e afectuosa, não posso perder tempo com textos tagarelas, palavrosos, entediantes. Nem com nada do género. Ninguém pode. Temos de ser lúcidos até um ponto intolerável.
Daqui em diante, vou aplicar-me a contar as minhas experiências e aventuras como novidades básicas, não há lugar na minha vida para redundâncias. Unicamente com o propósito de a eliminar, esforçar-me-ei por dar conta de que ou quando alguma coisa começa a ser excessiva ou supérflua.
E não haverá mais vazio nem sensação de que os dias já não são meus.
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