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Francisca Couceiro da Costa

por Zilda Cardoso, em 28.08.16

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Tive tanto gosto em visitá-la em casa, na sua casa/atelier! Diria um lugar construído para ela, embora pertença a uma freguesia muito antiga num velho bairro da cidade, historicamente ligada aos nossos descobrimentos…

A casa tem um telhado assotado com claraboias sobre uma sala que afinal são duas ou três. Separadas, se bem que nenhuma parede as demarque. Nem nada. E há duas varandas com plantas de grande porte que dão ilusão de estarmos ao nível do jardim.

As salas são separadas por si ou em si e pelo conteúdo, embora me pareça que o recheio de qualquer delas seja igualmente adequado às outras. Há profusão de recordações de viagens para lugares distantes ou próximos, coisas pequenas que chamaram a sua atenção e colheu – flores secas, pedras, tiras de tecidos, conchas, não sei o quê.

A casa é no alto de Santa Catarina, no mais alto. Toquei a campainha e ouvi um ruido antigo de porta a abrir-se e a deixar ver uma grande escadaria estreita de madeira clara e vários patamares quadrados.

Era uma pirâmide com valor de culto e, de pé, à porta, prolongando a distância entre mim e ela, no ponto mais alto, lá estava… de conto de fadas ou fada de contos, irradiando, brilhante e curiosa e interessada.

Depois moveu-se, mostrou-me talvez o seu mundo, falou-me de coisas concretas, das suas exposições, de inspirações, das suas referências, das técnicas que usa e, sobretudo, dos pensamentos que lhe ocorrem ou que lhe ocupam a mente enquanto trabalha.

Pareceu-me que considera que as suas referências vêm de dentro e não tanto do que observa. Talvez dissesse que o mundo exterior é muito trabalhado dentro de si antes de ser transformado em obra. E não apenas a sua experiência, mas também o que estudou e pesquisou, quer dizer, os percursos de outros a formaram.

As obras que vi (e já em 1995 a Galeria Vantag tinha exposto obras suas) parecem-me enigmáticas. Serão coisas que escondem um outro lado ou o revelam se nos esforçarmos por ver? Verdades?

Tenho que rever as considerações de Heidegger sobre a origem da obra de arte, sobre a essência da arte. E falarei de novo com a artista Francisca Couceiro da Costa cuja obra me convida fortemente a meditar.

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publicado às 21:23

O Porto e os turistas

por Zilda Cardoso, em 21.08.16

Estive cerca de meia-hora na fila para estacionar o carro junto da Alfândega. Depois vim a pé pelo calor até ao Armazém onde anunciavam uma feira de velharias.

Achei as velharias muito velhas, não me diverti. E insignificantes, com raras excepções. Havia um vendedor habitualmente em Caminha que prometeu receber-me bem quando fosse à sua loja naquela vila. Prometi e vou… proximamente.

Noutros lugares dentro do recinto, objectos  género Portobello Road Market, que recordo ver lá, exactamente iguais ou os mesmos, quem sabe, tantos anos depois, eram uma sensaboria!

Outra vez na rua, com muito calor, fui beber um sumo de laranja fresco. Lembrei-me de um lugar interessante…

Recordo uma grande ramada a cobrir todo o  quadrado do recinto com cachos de uvas pendurados nesta altura do ano, suponho que eram uvas americanas muito cheirosas que refrescavam e perfumavam o ambiente. E davam-lhe um ar exótico, não provinciano, em plena baixa da cidade. em frente à Igreja de S. Francisco onde os turistas se acumulam.

Desapareceu.

Arrancaram as videiras centenárias sem dó nem piedade e plantaram guarda-sóis brancos, mesas e cadeiras pretas, very commun. Uma triste inovação!

Bebi o sumo, supostamente de laranja, voltei à rua, onde me senti turista cansado e portuense decepcionado, apesar da agitação.

Como nunca tínhamos reparado nesta cidade, estabelecida há tantos anos (desde o Bronze) nesta beira-mar-rio?! Como nunca tínhamos descoberto os seus encantos e recantos singulares! As muralhas e as suas portas, os morros, as escarpas, o cimo de vila e o rio da vila, a ribeira… Não demos importância à sua importância: à tão remota fundação, à refundação, ao crescimento e autonomia graças a uma intensa actividade comercial e marítima…Gosto de pensar que foi muito por gentileza do Rio que por alguma razão é Douro.

Andámos muito distraídos.

Voltei ao parque de estacionamento e saí sem problemas ao encontro de casa, sem pressa, sempre por entre os milhares deles a cumprir a missão de conhecer a cidade antiga e sombria. Achei que não tinham o ar suficientemente festivo de quem está gozando férias e aventuras. Pareciam afectados pela sombra do granito em dia de sol intenso. Do granito e da seriedade que parece ser característica a que não nos é possível fugir.

Precisamos de oferecer outras hipóteses e condições de aventuras mais brincalhonas, senão daqui a pouco, eles deixam-nos sós e já habituados a este reboliço.

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publicado às 18:03

Bolas de sabão

por Zilda Cardoso, em 19.08.16

(imagem da Internet)

Semear ou plantar um jardim e pensar que vai nascer ou crescer alguma planta peculiar, ou sequer aquilo que é suposto e podemos esperar que nasça… é saber muito pouco de jardim e sobretudo acerca de pensar. Não nascerá o que sonhamos, mas o que as sementes ou as pequenas plantas têm capacidade de fazer nascer ou crescer. E nunca sabemos até que ponto o ambiente tem influência ou é decisivo…

Assim se torna difícil desenhar um jardim formal em frente a uma grande casa de família, um jardim organizado para satisfazer gostos e eventualidades, talvez lugar sossegado para borboletas visitarem, para pássaros fazerem os seus ninhos não definitivos - lugares efémeros de cantos e brincadeiras.É delicado.

Já nos tem sido solicitado desenhar um jardim com diversos canteiros para flores coloridas, apenas três cores e a branca, e perfumadoras, e também com um grande lago recortado a reflectir a montanha, um tanque com peixes azuis e sorridentes e agapantos por perto, árvores e arbustos de belas folhagens e ao longe um riacho com pedras graníticas para a água saltar e trautear. 

Já nos tem sido solicitado.

Ocorrerão belos pensamentos nesse jardim. E o que acontece com aqueles colocados no jardim interior?

Pensamentos ainda inocentes plantados e talvez semeados na nossa cabeça, no que chamo jardim interior, raras vezes nascem como desejaríamos ou crescem, por mais que os acarinhemos (não sabemos como acarinhá-los).

Há uma analogia: tal como no jardim formal desenhado no papel próprio... a maior parte desaparece, não chegam a nascer alguns ou não hão-de crescer outros.

Eu disto tenho larga experiência.

Não há dia em que não me ocupe a persegui-los antes mesmo de saber se são ou não relevantes. Por mais interessada que esteja em conhecê-los, eles fogem, somem-se.

São como bolhas de sabão, bolas de sabão, frágeis como elas, nem precisam de ser tocadas para se desfazerem, vejo-as ligeiramente coloridas cada uma com todas as cores do arco-íris, transparentes, cristalinas, tentadoras.

Tento apanhá-las, mas, ai, estalam, espatifam-se, desaparecem de todo, julgo que para sempre: não as reconheceria se voltasse a vê-las.

Ficarão uns salpicos? Que serão em breve absorvidos? Pelo quê?

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publicado às 09:55

Espírito olímpico

por Zilda Cardoso, em 14.08.16

Não acreditem se algum dia lhes disser que este é o mesmo sítio que desde há 2 semanas me entusiasmava com o seu brilho, o calor, os risos e as correrias de miúdos e de graúdos, os movimentos vivos de tanto viver com alegria, os gritos das gaivotas e o ar insuportavelmente quente e difícil de respirar sem queimar por dentro…

Hoje não há vento e essa espécie de neblina de cor lilás que caiu sobre este tipo de mundo e me prende nele em passeio por aí, como teia de aranha astuta que não me deixa sair limpa, e eu quero sair…

As poucas pessoas que se passeiam pela esplanada estão murchas: não falam umas com as outras nem fazem gestos expressivos como seria de esperar de surdos-mudos, não sorriem nem se animam.

A praia está deserta e… não foi para isso que se fez a praia. Lamento.

A neblina ou a teia ou o que quer que nos cobre começa neste momento a mudar de cor, talvez alguma coisa vá suceder afinal. Porventura, as gaivotas estejam prestes a sair do retiro e as pessoas despertem e se animem.

Sempre pensei que o silêncio fosse propício à meditação, à concentração, ao pensamento ordenado que nos aproxima do que nos importa saber.

Este não é. Isto é. É preciso muito mais do que silêncio para lá chegar, mas o silêncio é necessário, é a base de qualquer tentativa de conhecer. Um certo silêncio, não este: este aqui, agora, assim, que é apenas ausência de condições ruidosas adversas e talvez nos permita um dia compreender o nada.

Não me interessa conhecer o nada, detesto o nada.

Nestas circunstâncias, o que podemos pensar, pensar muito e até da forma perdulária que nos é habitual, como diz Steiner, mostra um “consumo ostensivo no seu pior” consumo de pensamentos, é evidente, para nada. Que outra coisa poderia ser?

De modo que assim consumida, voltei para casa e resolvi pensar no espírito olímpico e ver alguns jogos de excelência, com alegre superação pessoal dos jogadores e bem demonstrado apreço de uns pelos outros.

O valor do bom exemplo e respeito pelos princípios éticos fundamentais levará à união entre os povos dos cinco continentes.

Acho que aprendi umas coisas.

 

(imagem da Net)

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publicado às 21:59

Retratar o mundo (a partir da janela do meu quarto)

por Zilda Cardoso, em 03.08.16

 

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Convenci-me, esta manhã, de que o mundo era constituído por camadas de folhagem de muito diversas cores e formas. Cores distintas.

Quero dizer, todas verdes mas de muitas tonalidades, sombras e transparências, pela razão de observar da janela do meu quarto que é um largo rectângulo desenhado pelo Siza e… É isso. Camadas verdes sobrepostas, camadas e camadas. Séries, talvez possa dizer, layers.

Vem um vento leve e as folhas dançam, detêm-se e logo voltam a bailar. Modificam as suas posições nas árvores e nas ramadas.

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No abacateiro, as folhas duras e compridas sentem o vento a um ritmo forte e dançam com tal entusiasmo que, por vezes, caem pesadamente. Que digo? Pesadamente? Até tilintam no chão, como vidro!

O mesmo vento nas folhas da vinha é sentido com moderação, a dança poderá dizer-se nostálgica. Será um tango dengoso, meio argentino, meio uruguaio.

Alteram-se as sombras.

Há-as de folhas projectadas nas folhas de outra camada de folhas. E todas elas cabriolam: as folhas e as sombras. Vê-se o céu azul, muito azul, em minúsculas figuras geométricas por entre as camadas/estratos verdes.

Então não é só verde, parece que o vento tem cor e empresta-a. Ou modifica a cor do mundo, aqui, na minha frente e na minha presença.

Logo vem o sol e dá-lhes pitorescos coloridos e mesmo novos perfumes. Corro a cortina e admiro a projecção dos ramos sobre ela, através do vidro. Miro do outro lado, de dentro do quarto.

E tento adivinhar o que está a acontecer.

Fotografo para que vejam e me possam ajudar a descobrir e a inventar.

 

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publicado às 14:04




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