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Tenho tentado instalar-me num silêncio de qualidade que me permita pensar.
Silêncio de qualidade, segundo G. Steiner, será o que nos permite transformar em “pensamento” ”o bric-á-brac, o refugo e o lixo da nossa corrente mental”. Quer dizer, deve ser de molde a afastar pensamentos perturbadores e inúteis e a deixar que outros interessantes se expandam, ganhem terreno, bifurquem, se desenvolvam e transformem noutros mais acertados e produtivos.
Um pouco à maneira da meditação budista. Não propriamente esvaziar a cabeça, mas arranjar espaço para o que importa, já que vazia ela não fica nunca. Em boas condições, podemos alterar o rumo do pensamento, levá-lo por outros caminhos, por bons caminhos. Penso que é o que pretendem com a meditação.
Assim, o silêncio é indispensável à meditação: silêncio em mim… um lugar exterior silencioso. É evidente que é apenas um modo de dizer, nunca se faz silêncio completo nem dentro nem fora de nós.
Na verdade, eu tento.
Parece que noutros tempos havia mais possibilidade de chegarmos lá, de descobrir o sentido das coisas e de o comunicar, se bem que se admita estarmos longe de ser o homo sapiens de que nos orgulhamos. Com muito menos máquinas, outrora, tivemos ensejo de obter mais silêncios. E de realizar mais descobertas e invenções. De escrever poemas ainda mais extraordinários. E sinfonias divinais.
Eu tenho obras no prédio, obras de martelo pneumático a funcionar de manhã à noite e a minha casa tornou-se cacofónica. E há a rua barulhenta. E há a televisão e o seu intrincado e ensurdecedor estrondo de que nem é bom falar. (Se fosse bom falar disso, teria que analisar as análises dos analistas. E os comentários dos comentadores. De futebol e doutros). E, depois e sobretudo, há o ruido interior trazido pela comunicação electrónica – computador, telemóvel, internet, emails… - tudo o que me acompanha para onde quer que vá. E me ocupa a mente.
Como posso filosofar?
Filosofar nunca foi para qualquer um, com ou sem ruído, eu sei. Tudo isto soa a desculpa, a argumentação insossa. O silêncio será o menos importante, não será o principal, se bem que ninguém saiba se o principal é... se o que dá valor e qualidade ao pensamento é o material de que ele é feito. O material material,
Estou a interrogar-me ainda se é ou não irreparável para a humanidade a perda da capacidade de filosofar?
Ou, por exemplo, se haverá lugar para uma outra filosofia inimaginável no momento? Inútil perguntar quais serão as características dos grandes pensamentos da era que está por vir. Serão sem dúvida formas mais ou menos complexas de química molecular, como se anuncia.
Porém tenho que perguntar ainda e sempre: importa? E o sentido... importa?
Gostava de estar cá para ver e participar da aventura.
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