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Num dia da semana passada, o termómetro da minha varanda marcou, em certa hora da tarde, 40 graus centígrados. Custou-me a aceitar, mas fiquei contente, não porque estava tanto calor mas pelo ar límpido, o mar calmo e o céu azul. E toda a gente bem-disposta, muitos tomando banho no mar, ou o sol na areia ou na esplanada. Parecia terem-se prolongado as férias de Verão.
Meados de Outubro numa cidade-do-Norte-frio-e-húmido é invulgar.
Dispus-me a gozar este bem até ao último suspiro.
Mas foi necessário substituir o grande vidro da sala, vidro duplo e complicadamente constituído, para evitar, dentro, o calor em excesso.
Retirá-lo foi o cabo dos trabalhos, acabou por sair em fragmentos, havendo o risco de caírem para fora e ferirem alguém em qualquer das varandas inferiores ou já no rés-do-chão. Foi um sofrimento toda a manhã, ver os quatro homens agarrados aos pedaços de vidro daquele caixilho tão gigante que nunca mais acabava. Nem eles acabavam!
De vez em quando, inclinavam-se para o abismo e eu ficava em pânico, perguntando-me o que mudaria no mundo se…
E que relação tinha eu com o mundo, do meu velho eu interior para o actual exterior só pedras de calçada? Havia uma realidade quase que como posta em palco e, por muitos minutos, houve apenas a realidade sem vidro e sem palco, a realidade do mundo que existe. Nunca tinha visto. Há trinta anos a olhar intensamente para este cenário e nunca o tinha visto com esta clareza: não era um cenário, era alguma coisa que não posso evitar que exista.
Gostava que o Manuel de Oliveira filmasse o movimento, a cena, e não sei por que razão gostava.
Depois, armei-me de extrema resignação, fiz umas quantas perguntas estúpidas e ouvi que acontece. Que acontece… “Ou julga que alguém quis que acontecesse…?” Que o vidro superespecial se deteriorasse mal foi colocado?
Como? Garanti que não julgo nada disso.
E se não acontecesse? Esta é outra das ideias absurdas que de súbito me assalta: e se os vidros estivessem bem fabricados e tivessem sido correctamente colocados desde o princípio?
Será uma questão fundamental no nosso tempo (questão, não pergunta). Justifica-se o que se executa errado com acontece. Por que havemos de nos ralar se acontece muito para além da nossa vontade, do nosso interesse, do nosso gosto? Ou da nossa sabedoria?
Acontece e isto só por si dá dignidade ao facto!
Deu um trabalhão, um desmedido prejuízo para várias pessoas antes de chegar a mim. Para já ninguém foi engolido, houve apenas um golpe e um número de malabarismo sem protecção, mas não deixa de ser um pequeno drama tomado de um plano muito pouco verosímil.
Qualquer vidro da casa, teria sido substituído sem grande problema, mas não aquele. Por isso, tinha que ser aquele, o tal.
Para mim, o assunto pode ser encarado como o absurdo da negligência elevado à potência máxima, considerada aqui em suspenso (não tenho a certeza de que tivesse sido negligência apenas porque não posso provar, mas teimosamente considero negligência não atribuída a alguém).
Contemplo em recolhimento a superfície dourada deste lugar longínquo em redor do pôr-do-sol, em frente a mim, sobre o mar.
Olho em silêncio, não digo palavas doces e aveludadas. Quero dar ideia do meu sentir a quem não estiver perto nem do lugar nem de mim, no momento. Di-lo-ei em silêncio e vou transmiti-lo pelo mesmo silêncio como se se tratasse de uma nuvem a ser levemente empurrada pelo vento e transportado o seu conteúdo ou o sentido para distinto lugar. Fazer que também outros o sintam e que o amem, sendo o mesmo. Que ouçam, que se emocionem. Sem palavras proferidas. Sem escrita.
O Sol, ele, lá vai e… foi. Fica no céu um dourado mais queimado e depois… um cinzento incomparável.
E eu… receio sempre… e penso.
Parece-me que o Sol tem uma tarefa e empenha-se em cumpri-la correctamente. Não lhe importa a minha visão-impressão do que está a acontecer... Que seja, para mim, uma beleza ou o oposto, o que vejo.
Os outros elementos movimentam-se sempre de modo inesperado – as nuvens, os nevoeiros, as chuvas, os ventos… Cada dia, vêm para aqui, vão para acolá, nunca muito tempo no mesmo lugar nem com o mesmo ritmo de mudança… mas ele continua, seja o que for que aconteça, igual.
Igual. Seguindo o caminho que ele conhece e mais ninguém, por certo.
É assim há milhões de anos, num determinado momento pode deixar de ser. Pode deixar de ser tal qual é hoje.
Julgo poder assistir, dessa vez, a uma coisa portentosa, admirável, esplêndida, não vista anteriormente. E que me vai iluminar.
Emociono-me. Fico ansiosa, alvoroçada, espero.
Não sei se fico feliz ou não por finalmente não acontecer, ele continua imperturbável. Não busca porque sabe. E não lhe importa a minha procura de sentido.
Conservei a esperança e o desejo, ele regressará. E querem saber?
Já me não pergunto o que significa o mundo e o seu movimento. É ocioso perguntar já que apenas a procura tem sentido, é o que me cabe fazer.
Se quero uma resposta, se querem uma resposta, só posso inventá-la.
Miguel Real, no auditorio 2 da Fundação Gulbenkian, presidido por Ramalho Eanes, falou de A Sibila e da revolução que o romance provocou no panorama literário português.
O que mais me diverte a respeito do romance e dessa transformação profunda é o que a Agustina disse, num certo momento, há já muitos anos, depois de ouvir complexas análises e críticas à obra: “Julguei que estava a escrever a história da minha tia Amélia!”
O livro foi premiado em 1953 e em 1954 e reeditado desde então com sucesso de críticos e de leitores.
É considerado inclassificável pelos teóricos da literatura, mas também neo-realista e modernista da "terceira fase do modernismo português". Não penso que alguma destas apreciações importe. O que é genial na autora é a sua capacidade de conceber mundos e construir possibilidades lógicas e narrativas. E de reflectir sobre a sua própria construção.
Houve muitas sibilas nos séculos passados, já não há. Eu conheci algumas: eram mulheres inteligentes e de pouca instrução. Agiam por intuição ou assim se dizia.
Não tinham muitos estudos científicos mas adivinhavam o que iria acontecer segundo todas as probabilidades e o corrente bom senso. Os homens tinham medo delas, diziam que eram bruxas, que tinham poderes.
Na mitologia grega, sibila é uma profetisa: foi Sibila que Agustina chamou à sua tia Amélia e ao romance mais original da época em que apareceu, aquele que tornou famoso o seu nome de escritora.
É também uma das personagens da ópera com libreto seu, estreada na Fundação em 14 de Outubro no âmbito do Congresso, uma das três mulheres com máscara de ferro que a protagonizam.
Reproduzo um pequeno trecho de A Sibila.
“É esta a mais grandiosa história dos homens, a de tudo o que estremece, sonha, espera e tenta, sob a carapaça da sua consciência, sob a pele, sob os nervos, sob os dias felizes e monótonos, os desejos concretos, a banalidade que escorre das suas vidas. Os seus crimes e as suas redenções, as suas vítimas e os seus algozes, a concordância dos seus sentidos com a sua moral. Tudo o que vivemos nos faz inimigos, estranhos, incapazes de fraternidade. Mas o que fica irrealizado, sombrio, vencido, dentro da alma mais mesquinha e apagada é o bastante para irmanar esta semente humana cujos triunfos mais maravilhosos jamais se igualam com o que, em nós mesmos, ficará para sempre renúncia, desespero e vaga vibração. O mais veemente dos vencedores e o mendigo que se apoia num raio de sol para viver um dia mais, equivalem-se, não como valores de aptidões ou de razão, não talvez como sentido metafísico ou direito abstracto, mas pelo que em si é a atormentada continuidade do homem, o que, sem impulso, fica sob o coração, quase esperança sem nome.”
Serão estes pensamentos intuições filosóficas...? Ou metáforas...?
E... alguma coisa terá sido dita durante estes longos dias de reflexões...?
Tenho de explicar vários detalhes:
Primeiro: o congresso a que me refiro é o promovido pelo Círculo Literário Agustina Bessa-Luís e que terminou no dia 15 p.p. na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
Segundo: o meu interesse que foi o de conhecer melhor a obra de Agustina, analisada quase dissecada agora por estudiosos, académicos, professores catedráticos, políticos, pensadores e críticos, escritores e ensaístas, nos aspectos ético e político.
As numerosas comunicações apresentadas, muito interessantes, dão bem ideia do valor da obra que é digna de toda a divulgação que lhe dermos, não apenas no País como e especialmente fora dele.
Aqui fomos alertados para o facto de não nos podermos conceder o luxo de não dar a conhecer a extraordinária criação de uma grande romancista criadora de mundos, escritora inteligentíssima, nascida e a viver neste pequeno país com todos os seus inúmeros mínimos problemas.
A mim, faltou-me cabeça para apreender o que gostaria de ter apreendido: dois dias de intensa e concentrada atenção, desde as 9 da manhã até possivelmente às 24 horas, no dia da Ópera, era decerto mais do que podia arcar, por muito gosto que tivesse no que estava a fazer.
Duas salas estiveram sempre ocupadas em simultâneo com palestras a respeito dos temas propostos; falaram da Obra, da Autora, da Mulher e do seu Génio, tudo com maiúsculas.
Espero que fosse apenas o apontar de problemas que precisam ser resolvidos quanto à difusão. Um deles, é o da falta de traduções para Inglês, tornado espécie de língua universal, sem o que não há divulgação com a grandeza que merece.
Seja como for, espero que os diversos textos sejam publicados para regalo de todos e estudo dos que apreciam estudar.
Às 22 horas do dia 14 houve ópera – um libreto de Agustina e música de E. Carrapatoso que é um grande feito – um acontecimento inesperado e terrivelmente curioso. Os protagonistas em palco são três das suas principais personagens femininas, as mais fortes: Quina ou a Sibila que a tornou célebre, Fanny que na nossa imaginação se liga a Camilo e às famílias inglesas do Porto no século ultra-romântico e Ema ou a Bovarinha aliada a Flaubert, a Manoel de Oliveira e ao Douro.
Agustina pode pensar e escrever do modo que quiser, usando os meios disponíveis, sobre qualquer tema – não deixa espaços em branco.
Duas amigas a viver no Porto por quem tenho um carinho muito especial, são ambas notáveis escritoras: Agustina Bessa-Luís e Luísa Dacosta.
Nas suas escritas, não há nada que as aproxime, mas neste momento recordo-as por uma razão: estão tranquilas, arrumaram o papel e o lápis depois de muitos anos de trabalho intenso e de preocupações com o mundo, de tentativas de o compreender e de descobrir novos sentidos para o que acontece. E de nos mostrarem as suas descobertas.
Tinham em comum a paixão da escrita e foram muito longe no caminho que queriam percorrer, especialmente Agustina.
Tem um grupo muito importante a trabalhar na divulgação da sua obra, é o Círculo Literário Agustina Bessa-Luís que realizará ainda este mês (14 e 15 de Outubro) um congresso em que serão apresentados trabalhos sobre ética e política na sua obra. O Círculo propõe-se promover a divulgação das obras na Europa e na América das formas possíveis.
"Este Círculo tem por objeto específico ser um lugar de encontro de leitores e admiradores da obra de Agustina Bessa-Luís e que decidem pôr a energia associativa, através de realizações de carácter próprio - estudos, reuniões, manifestações artísticas e científicas, publicações etc. - ao serviço do conhecimento universal da sua obra."
E, a-propósito de Luísa Dacosta que ninguém que a conheça gostaria de ver esquecida porque está muito longe de merecer, publico um pequeno texto escrito em 1992 por Eduardo Prado Coelho que diz muito do que ela é.
Combinámos com muita antecedência, já não almoçávamos juntos na casa deles, há demasiado tempo.
E pronto, fui de táxi para não falhar na hora, sobretudo. Sabia como era importante ser pontual, respeitar o acordado, ainda há quem o preze.
Tinha eu tido uma manhã muito ocupada. E devia procurar a casa, não tarefa fácil. Iria demorar. Muitos prédios tinham sido por ali construídos desde que eu frequentava a casa com regularidade, ruas tinham sido abertas, patamares, plataformas, escadas, pedaços de jardins - o mapa do sítio estava radicalmente alterado.
Deixei o meu carro à porta de casa e fui de táxi. Quando disse a morada ao taxista, ele respondeu todo risonho: “Não sei onde é, mas se a senhora me der umas dicas… vou lá”.
Bolas, tudo o que eu não queria, porque não sabia, era dar umas dicas. Foi um lindo serviço, pensei, muito esperta... julgando ter encontrado solução fácil para o problema...
Mas lá fomos os dois, até onde o GPS indicou e depois … chapéu. “Tenho muita pena”, disse ele, “mas não posso fazer mais. Deixo-a aqui”.
E eu, com dois sacos na mão, olhei em volta, procurei os números de polícia nas portas altas que não vi e… nada, não encontrei a casa.
Acabei por lançar um SOS à distância e ela respondeu: “Estou a ver-te, não saias daí. Vou já ter contigo”.
Que bom existir uma coisa chamada telemóvel! Assunto arrumado.
Passando a outro: a casa estava um esplendor - moderna, arejada, cheia de luz e de música, de transparências e de belos objectos funcionais. Senti-me tão bem!
Conversámos com facilidade, pequenos temas agradáveis. A mesa magnífica de toalha branca, adamascada e antiga, com renda de duas agulhas muito fina e os pratos, os talheres de prata, os copos… tudo aprimorado e bem escolhido. Uma única e invulgar rosa perfumada, de uma cor-bela-que-não-sei dizer achava-se sobre a mesa.
Era perfeita.
A comida deu um quefazer especial, calculo. Os anfitriões foram a Angeiras propositadamente comprar um peixe acabado de pescar, coitado, que serviram envolvido em papel prateado e sob sal. E batatas amarelinhas cosidas inteiras, parcialmente mergulhadas em azeite dourado, saladas diversas de incertas cores, bem apresentadas, uma frescura de vinho que dizem ser branco mas também é dourado, mais pálido, decerto com menos teor de certo metal para condizer com o resto das preciosidades.
O interessante é que eu não estava fascinada mas comovida: era para mim, calculo que era para mim tudo aquilo!
Era como se fosse. Como uma homenagem!
Rendo-me, muito obrigada!
O Congresso Internacional sobre Ética e Política na obra de Agustina Bessa-Luís, organizado pelo Círculo Literário A.B.-L. realizar-se-á em 14 e 15 de Outubro na Fundação Gulbenkian, em Lisboa.
Eis um pequeno trecho de 1960 da obra Embaixada a Calígula, de Agustina, exemplar livro de viagens que não me canso de admirar.
“Muita gente muda de lugar, passa de um a outro continente, retém na memória factos sobrevindos em diversas latitudes. Mas a viagem, com o seu mistério e a sua intimação à consciência, com as suas alegrias que nascem inexplicavelmente dum golpe de vento na poeira sobre uma ponte, duma sensação de vida isolada e profunda quando atravessamos uma terra estrangeira – ah, essa viagem poucos a podem experimentar!”
Fiquei a fechar os olhos e a repetir docemente as últimas palavras que tinham surgido no meu pensamento.
Mas as últimas palavras, quase sonhadas, foram perdendo sentido, foram perdendo… até já não terem sentido nenhum, desfasadas das mais, sem ligação ao que estava pensado antes.
Fiquei a dormitar, a deixar cair o livro, sentia-o ainda nos dedos… nas pontas…
Quando despertei, dessas recentes palavras, obscuras, de antes de adormecer, não me lembrei de nenhuma, fiquei a matutar na fragilidade de estrutura da memória.
Não vale a pena esforçar-me mais por memorar e desconsolar-me, aquelas palavras são com certeza insignificantes em si, puramente banais e é mais valioso esquecê-las por inteiro, sem remorsos, para que não vão ocupar inutilmente espaço na razão.
Fosse como fosse, nunca mais seriam as mesmas depois da perturbadora viagem por mundos razoavelmente desconhecidos, mesmo que continuassem a existir. E se fossem portadoras dalguma verdade, apenas poderia ser outra verdade, não a primeira.
De resto, há momentos, há muitos momentos em que as palavras e os seus conteúdos viajando nas nuvens, serenamente, de súbito, explodem, algo as faz aí rebentar, e dispersam-se. E não há nada a fazer.
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Muita gente sente da mesma maneira, quero dizer, tem os mesmos sentimentos em relação às mesmas coisas, mas pouca sabe falar disso de forma que interesse aos outros, quero dizer, com um mínimo de distância.
Ele sabe, é tão inteligente! Acima de tudo, sabe pensar o que sente, sabe explicar o que pensa. E di-lo. Ou escreve-o. E ficamos a saber, se formos quase tão inteligentes como ele.
As horas não passavam, estava terrivelmente maçada. Decidi que há muito não visitava os pássaros do estuário, quase me esqueci deles.
Levei pão seco e dei-o aos patos da minha preferência, sempre aguerridos e ávidos ou esfomeados, antes que as gaivotas invadissem o terreno e não deixassem ninguém mais aproximar-se.
Pelo caminho, pensei: sempre o mesmo, o mesmo caminho. O mar á direita com reflexos prateados do sol de sempre. O rio com cores brilhantes. As árvores, meu Deus, as árvores, os passeios, as casas, as ruas, os nomes… tudo igual e impossível. O céu é mais uma vez azul e não tem nuvens nem desenhos de algum padrão.
O que esperava eu que me desse contentamento? Que me libertasse? Esta redundância?
Os carros passam nos mesmos sentidos de ontem e de anteontem, as pessoas para lá e para cá usam os mesmos gestos mais ou menos fluidos, as gaivotas soltam os gritos estrídulos de todos os dias…
Não me é possível continuar a apreciar o lugar, a menos que uma bomba arrase tudo, esvazie tudo, e a vida possa começar a partir do deserto. Comece inteiramente nova.
Reparo, olhando com intensidade e concentração, que as árvores e as suas folhas parecem esmaecidas, mas os reflexos na água têm já algumas das sombrias cores garridas do Outono. Os sons amadurecem e os odores são mais murchos. Como pude não reparar?
Já não é Setembro, ainda não é Outono.
Do meu lugar ao sol, retirado, fico-me a contemplar os folguedos dos pássaros mergulhadores e dou-me conta da alegria com que mergulham e correm e saltam e fogem firmes.
O mar não tem uma onde hoje, agora, apenas fulgurações e promessas. O ar incrivelmente quente sem humor algum, é abafado e estranho.
Aproximo-me da imensidão do mar, ao meu lado e, no meu desejo de ternura, penso no que há nele de transcendente, se há.
De súbito, compreendo.
Um desses pássaros compactos e enormes passou por mim e tocou-me ligeiramente. Oh, muito ligeiramente! Já me sinto bem, acarinhada, mais curiosa ainda e animada.
Estou rodeada de vida crepitante, onde estiver, participo nela quer queira quer não, (e quero), como num jogo que me desperta e me possibilita sentir-me menos só.
Como doutras vezes, concluo que todo este mundo me diz respeito, não necessito ter medo… apenas o olhar disponível.
Agora vejo e sei que vejo, o que for. Apenas preciso de encontrar as cores das palavras apropriadas ou as palavras das cores adequadas, as que correspondam ao meu sentir, ao meu ver e ao tempo que passa, para poder falar disto.
"Registo do gorjeio", palavras de Barthes citadas por E.P.C.
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