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Pergunto-me o que faz ele ali em frente ao piano, tocando-o ora com suavidade ora com dureza, enquanto pesquisa intensamente as teclas ou volta o olhar para o alto…
Ocorre-me e logo tenho a certeza de que ele está a criar um mundo para mim e procura inspiração. Porque quer que seja um mundo fascinante e bom. E procura-o dentro de si no seu coração...e no exterior de si, no firmamento.
Tem a ver com pássaros ou com borboletas, não sei… com luz ou com penumbra… com silêncio e com sons estranhamente cheios de silêncio ou de ruídos de água que flui branda, da que cai do alto e mal toca no cristal, raramente da que jorra com energia… Então são paisagens de sonho com lagoas no meio da areia, com esses sons tranquilos e com os longínquos, sons que semelham silêncios, silêncios que semelham sons, sons do seu silêncio, do silêncio dele.
Tem a ver também com amor, com ternura, com visões românticas e relevos suaves, com sorrisos… Sinto que tudo isso é para mim e fico bem, apaziguada e feliz.
Penso se é estranho este mundo!?
Ele, o Arcadi Volodos, está tão feliz como eu, esforçando-se por me agradar, como isso sabe bem. Agradeço-lhe e aplaudo com gosto e entusiasmo.
O mundo que evoca, apoiado nos autores da música, Schubert, Brahms, Schumann, romântico e divertido, belo e subtil criador doutras visões, é também leve e brilhante … É esse.
Quero dizer, pode ser saltitante, pode haver nele maldades e desgostos e contradição de sentimentos. Pode? Haverá violência, atrevimento, ousadias…É, com certeza, misterioso, e cheiinho, isso sim, de luz e de bondade, de carinho e de compaixão; mundo meditado, mundo reflectido (que resultou de reflexão).
O nosso.
Raramente leio as estrelas.
Prefiro o sol brilhante num céu de mil cores ou inteiramente azul e liso.
(trabalhos de Marcela Navascués, vistos na Vantag)
Concordo que um céu de estrelas é bonito, pelo menos bonito. Pode ser mesmo deslumbrante e aí rendo-me: fico a contemplá-lo da minha janela, não sinto vontade de caminhar sob.
Fico a contemplar.
Leio então e vejo que é tudo ilusão, cenário de tecido em forma de abóbada com estrelas costuradas nele até ao chão. Não há nada a fechá-lo. Pode ser facilmente atravessado, nada impede, nenhuma baliza. Nem talvez as imensíssimas distâncias, anos-luz, e muito mais que não sei contar.
As estrelas estão lá, afinal, peço desculpa, não costuradas mas soltas, cintilam muito arredadas do meu entendimento. Brincam à vontade como se fossem crianças na rua.
O que me permite vê-las assim de tão longe?
São de todas as cores que conheço. E belas, sedutoras e terrivelmente frias e distantes, como não podia deixar de ser.
Cintilam no tecto do meu quarto, onde eu as colei há anos. Estão lá sempre quando não há luz nem nuvens. São tão nocturnas como as outras. Escondem-se de dia, quando o tecto é branco e mais nada.
Revelam-se no escuro: que estranha maneira de existir!
O Sol, ainda alto, estava rubro, avermelhava o céu carregado de nuvens muito cinzentas e acolchoadas, e o mar era um espelho vermelho e azul, azul do céu e o seu próprio azul. Conhecem esta cor? Seria anil?
Sem vento àquela hora de fim de tarde, a temperatura era uma delícia.
Caminhei em direcção ao rio. Belíssimo.
E vi um homem inteiramente feliz e sorridente: acabara de pescar um minúsculo, muito minúsculo peixe prateado. E exclamava enquanto corria para a vedação onde os amigos o esperavam :
“Quem disse, mas quem disse que não havia peixe hoje por aqui?”
E exibia o mínimo prateado, pendurado ainda na linha, a contorcer-se todo, numa dança de morte, aquele que daí a pouco para os amigos se transformaria num guloso e atrevido e perigoso enorme tubarão: o seu orgulho de herói a quem ensinaram a pescar.
Não fico em silêncio, falo para mim, tanto que não me sobra tempo para falar com outros.
Mas, não, não fico em silêncio. Não esse silêncio.
Tenho muitas coisas para tratar...
Muitas coisas pelas quais me interessar, ver, estudar e… para dizer. Talvez vá a tempo de tomar
decisões já que escolhi os valores que me vão orientar. Que sempre me orientaram sem eu
dar por isso ou sem ter a certeza…
Que vasto é o mundo!
Por isso, continuo num silêncio perfeito, (preenchido), observando, tentando
compreender ainda, como se fosse fundamental, considerando fundamental tudo o que me
ocorre a propósito de mundo e de sentido.
Talvez um dia fale do que descobri.
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