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O outro concerto, jazz à la française, foi no sábado à noite no Teatro do Campo Alegre.
Muito longe da religiosidade, do drama e do lirismo tradicional do canto italiano que tinha ouvido na noite anterior… tratou-se de “jazz” ao gosto francês, para assinalar La Semaine de la Francophonie, promovido pela Alliance Française e o Consulat de France no Porto.
Yann Beaujouan na guitarra e Laurent Zeller no violino são o Duo Impressions que animou umas horas da nossa vida portuense com música de Django Reinhardt e de Stephane Grapelli e nos recordou as canções dos anos 40 e 50 de Charles Trenet, de Edith Piaf e de Charles Aznavour.
O Duo, regressado recentemente de uma viagem à China, actuou com muita alegria e exuberância e foi um privilégio ouvir a sua música saltitante e travessa. Era um jazz ligeiro combinado com melodias francesas e o ritmo, leve e de excelente musicalidade, completamente sedutor.
A entrada livre para o café-concerto, pena os lugares não terem sido disputados como mereciam.
Não deixo passar este dia em que vão ser eleitos - a mesa do conselho geral, o conselho fiscal e a direcção do Círculo Literário Agustina Bessa-Luís - sem falar um pouco do que tem sido a minha relação de amizade com a escritora ao longo de muitos anos.
O Círculo Literário A. B.-L. tem por missão estudar e divulgar a obra de um dos melhores escritores portugueses de sempre. E eu gostaria, tal como tenho feito noutras ocasiões, de prestar homenagem a quem, apesar de todas as excecionais características da sua obra, não encontrou o eco que merece e, como diz Eduardo Lourenço, “a que tem direito”.
Talvez, e é essa a ideia da criação do Círculo, esse estado de coisas comece agora a alterar-se: tudo dependerá do dinamismo, interesse e conhecimentos de quem vai dirigir a nova instituição.
Por mim, no momento, quero apenas falar um pouco da minha relação particular com a escritora, da importância de mostrar um lado distinto do seu temperamento, que é um interesse pelos outros, um desejo de ajudar (mas apenas depois de reconhecer as qualidades daqueles a quem ajuda, o que não deixa de ser interessante como reflexão).
Recordo uma entrevista que lhe fiz para O Comércio do Porto onde eu mantinha uma página semanal sobre problemas femininos. Eu própria achei a minha abordagem diferente porque tinha pouco a ver com ressentimentos mas muito com descoberta de novas actividades e ocupações de interesse para as mulheres.
Pode dizer-se que não era feminista? Tínhamos que definir o que entendemos por feminista e ela contribuiu enormemente para revelar esse mundo que é ou era o mundo onde as mulheres se movimentavam e eventualmente abafavam. A sua forma de encarar o tema, e qualquer tema, é sempre inteligente e sábia.
As suas relações comigo foram privilegiadas. Sentia uma cumplicidade nas suas atitudes, um desejo de agradar, sem dúvida e, mais uma vez, uma vontade de apoiar-me que eu, tolamente, nunca quis compreender.
(Vou continuar a falar das visitas, dos chás e do perfume a hortelã que ambas sentíamos quando o carrinho amarelo passava pelos campos e pisava as folhas frescas e verdes e depois o mundo rescendia).
Não deixo passar este dia em que vão ser eleitos - a mesa do conselho geral, o conselho fiscal e a direcção do Círculo Literário Agustina Bessa-Luís - sem falar um pouco do que tem sido a minha relação de amizade com a escritora ao longo de muitos anos.
O Círculo Literário A. B.-L. tem por missão estudar e divulgar a obra de um dos melhores escritores portugueses de sempre. E eu gostaria, tal como tenho feito noutras ocasiões, de prestar homenagem a quem, apesar de todas as excecionais características da sua obra, não encontrou o eco que merece e, como diz Eduardo Lourenço, “a que tem direito”.
Talvez, e é essa a ideia da criação do Círculo, esse estado de coisas comece agora a alterar-se: tudo dependerá do dinamismo, interesse e conhecimentos de quem vai dirigir a nova instituição.
Por mim, no momento, quero apenas falar um pouco da minha relação particular com a escritora, da importância de mostrar um lado distinto do seu temperamento, que é um interesse pelos outros, um desejo de ajudar (mas apenas depois de reconhecer as qualidades daqueles a quem ajuda, o que não deixa de ser interessante como reflexão).
Recordo uma entrevista que lhe fiz para O Comércio do Porto onde eu mantinha uma página semanal sobre problemas femininos. Eu própria achei a minha abordagem diferente porque tinha pouco a ver com ressentimentos mas muito com descoberta de novas actividades e ocupações de interesse para as mulheres.
Pode dizer-se que não era feminista? Tínhamos que definir o que entendemos por feminista e ela contribuiu enormemente para revelar esse mundo que é ou era o mundo onde as mulheres se movimentavam e eventualmente abafavam. A sua forma de encarar o tema, e qualquer tema, é sempre inteligente e sábia.
As suas relações comigo foram privilegiadas. Sentia uma cumplicidade nas suas atitudes, um desejo de agradar, sem dúvida e, mais uma vez, uma vontade de apoiar-me que eu, tolamente, nunca quis compreender.
(Vou continuar a falar das visitas, dos chás e do perfume a hortelã que ambas sentíamos quando o carrinho amarelo passava pelos campos e pisava as folhas frescas verdes. E o mundo rescendia).
Não há mais poemas da beira-mar. Apenas luz, luz intensa e milhares de pessoas coloridas correndo na Avenida, nos dois sentidos. Não sei o que significa (a extravagância de descobrir significados! E até sentidos!), mas será bom correr com um objectivo e ter tempo favorável para isso.
Se um dia caísse neve nesta rua, as pessoas não poderiam correr, derrapariam sucessivamente, não iriam longe, não iriam a lado nenhum. A menos que corresse só a alma ou que só ela continuasse a correr quando o corpo caísse. Seria interessante ver os corpos caídos e as almas continuarem em silêncio como é seu hábito, divertidas.
Neste momento, muito tempo depois, continuam a passar num único sentido, já não vão calorosas nem animadas, mas lentas e macambúzias, perderam os objectivos.
Não se pode perder os objectivos. As gaivotas voam obstinadas, têm uma direcção certa, vão em bando, muitas, poucas, têm objectivos. Ele, mar, não quer saber, mantém-se em silêncio.
“As nossas decisões mudam também a vida dos outros”, lembro-me de ter lido e é do senso comum. Mudam sem dúvida, de todas as maneiras, para bem e para mal, ou não tem nada a ver com bem nem com mal.
Qual é a minha decisão hoje? A que mudaria a vida de muita gente?
Deitada na cama, vejo o mar não muito longe com as suas riscas brancas de espuma atravessadas e torcidas e as bandeiras agitadas vermelhas acenando com frenesi na margem. Queria estar lá, junto delas, dando-me conta do que se passa, intervindo. Respirando o mesmo ar.
O que vejo daqui, o desenho do mar, é diferente do habitual. Tal como a decoração. Em geral, aprecio a ornamentação, as cores, as formas, os movimentos, as zangas e as meditações tranquilas. O perfume não chega até mim.
Haverá algum mistério ligado a este oceano tão profundo e superficial nas pequenas ondas fluidas cheiinhas de silêncio de modo que eu penso que me quer dizer um segredo importante!?
Por que haveria uma forma racional de explicar o que seria a verdade? Olho tranquila sem prazer nem dor porque o olho todos os dias e é por isso quase comum. Às vezes, parece autoritário.
Faço muitas pausas a olhá-lo. Divago um pouco, mas não sonho para além desta forma de mar. Ele mantém o silêncio, não creio que se dedique a reflexões de ordem metafísica. Mas talvez tenha uma postura poética e é essa que mais me atrai.
Nos dias de sol, tem um brilho insuperável e é o que o define, não a sua beleza que não sei se existe. Porém, nos dias sem sol…
Encontro hoje aqui poucos indícios de Primavera...
Nem a música nem a dança… Que perfume?
A espuma branca das ondas salta alto nos paredões
e uma neblina espessa cobre o longe para leste.
Mal vejo a ponte da mesma cor sobre o rio.
A passarada no estuário saiu inquieta para novos covis.
Pesados ramos de palmeiras caem sobre os passeios
enquanto circulam em grandes apuros visitantes soltos
agarrados aos casacos e a embrumados cabelos.
As pombas confundem-se e voam sem saber para onde
ou sabendo… como as gaivotas jogam contra o vento.
Denso é agora o céu acastanhado doloroso…
E o mar frisado, não sei descrever, enrola-se
em minúsculas ondas bravas, selvagens
que desagradam aos apaixonados-pelo-deslize-nelas.
São dispersas e organizadas como numa teia ou trama ou tela,
e progridem apressadas para o grande rio eterno.
De súbito, alguma coisa resplandece perto de mim,
ali, ao meu lado, um sonho?, um lampejo que me faz acreditar de novo
que a alegre colorida Primavera não se foi para sempre.
Saí para um tempo que prometia suavidade,
sem vento sem sol sem mar revolto, descuidada.
O céu cobria-se de rolos de material macio cinzento
E uma fina película nacarada transparente
surgiu entre o céu e nós, entre nós e os outros,
entre o céu e o mar, entre o céu e o pavimento luzente…
Interroguei-me sobre este céu que vejo todos os dias.
Era chuva o que começara a cair sem me dar conta?
Era uma queda de frescura mais do que chuva.
Até que vi que tinha de cuidar dos sítios onde pousava os pés,
poças onde os pássaros bebiam alegremente.
Daí a pouco, estava alagada mas continuei
a fotografar o mar e os barcos, as avenidas e o mais.
Então o sol abriu clareiras no céu carregado
iluminou tudo, encheu o mar de espelhos.
E choveu de novo e de novo o sol e logo a chuva…
E eu assoberbada de por quês,
de perguntas que não sei perguntar
porque não as sei pôr em palavras
apenas admiro a luz húmida e prateada e translúcida
que transformou e irrealizou a atmosfera
dando-lhe aquele estranho ar de mistério
e a mim a sensação de pura beleza e a satisfação
de um pensamento ímpar: é quase Primavera!
Pela manhã passeei como de hábito na beira-mar
sentindo profundamente o fascínio daquele instante
SEM fosse o que fosse que me pudesse desgostar.
O mar era o sítio semeado de estrelas de luz, muitas
onde grupos de minúsculos barcos e velas brancas
brincavam de roda perto de mim em límpido silêncio
e próximo de outro branco alta vela única, elegante.
Um ponto de luz no céu iluminava a cena com esplendor
e para além da cena. Sentei-me a olhar serenamente
decidindo não ouvir os ruídos - os guinchos, as palavras vazias,
apenas aquela música na margem cantava dentro de mim.
O instante não será repetido nunca, presumo
que nenhum instante é repetível e não de certo este.
Devo saboreá-lo no momento em que acontece
conhecendo que nada disto é recuperável
e que não sei contar sobre ele nem mesmo
que leve lápis e papel e tente registar a sensação
em escrita espontânea logo, num poema talvez
sem metáforas ou desenhando a cores ou retratando...
Apenas o guardarei na memória com diferenças.
E assim me levanto e caminho de regresso, sorridente,
a casa, saudando fascinada o mundo aqui e ali
e os ensejos de o fruir se não estiver ausente.
.
Passeei ao longo da praia
caminhei sobre as rochas…
Não havia pássaros, ninguém me seguia,
nem nuvens e o vento não corria.
A meu lado, o mar sereno
menos azul que o céu embora o espelhasse…
O sol radiava nele, vi, como uma ilha,
os barcos balançavam-se devagar.
Ouvi a canção que as coisas sussurram.
Sobre areia acastanhada, pedras de vários
tons acumulavam-se aqui e ali
sem segredo, sem raízes. Eu caminhava…
Era Inverno ainda. Tudo igual desde sempre.
Passei pelo lugar: nenhuma sombra, nada mudou
excepto o céu, as nuvens, o mar.
Os pássaros, os gritos de pássaros,
às vezes, estão lá, outras não.
Nesse tempo, chuto uma pedra e mudo o mundo.
A favor da pedra? A favor do mundo.
Aí está o novo… O lugar e eu.
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