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O silêncio dos inocentes

por Zilda Cardoso, em 24.02.13

 

Quando falo de silêncio, não me refiro ao ”silêncio dos inocentes”. Nem ao dos que assistem ao massacre de inocentes sem o denunciar e mesmo sentindo prazer na destruição. Nem ao excelente filme americano com aquele título, o thriller muitíssimo premiado, com a Jodie Foster e o Anthony Hopkins.

Não.

Não. Refiro-me ao silêncio que permite a meditação, se bem que saiba que é perfeitamente possível, embora difícil, meditar com muito ruído ambiente. Mas não é possível meditar com ruído interior.

Ruído interior é o que mais perturba.

De modo que se compreende que me refiro ao silêncio que permite pensar, no sentido de separar os pensamentos “sérios” dos que não são senão o tal ruído-que-perturba, o bric-à-brac de que fala G. Steiner e que não levará a nenhuma descoberta que interesse a alguém ou à humanidade em geral. E que nos levará a um extremo desassossego.

A meditação ajuda-me a manter-me razoavelmente tranquila e atenta. Sobretudo atenta. Atenta ao que me rodeia; ajuda-me a reparar melhor nos outros – nos seus sentimentos e emoções. E a uma melhor compreensão dos seus actos. E dos meus.

A meditação tem-me ajudado a reflectir, a pensar no que aprendi com o budismo e pus ou não em prática e de que modo posso melhorar ainda e sempre a vigilância aos meus próprios pensamentos, a distingui-los, a escolhê-los.

Concluo que talvez consigamos viver uma existência mais agradável, mais simples, mais satisfatória, mais feliz, desse modo.

Porém, há as condições externas actuais do mundo em que vivemos no Ocidente, pelo menos, e que são causa importante de mal-estar para todos.

É o ruído exterior que não devia perturbar-nos, mas que, neste período da nossa vida, é avassalador.

E não me refiro às más condições económicas, mas às outras más condições, aos conflitos permanentes que têm permitido os temas envenenados transmitidos pelos meios de comunicação que, quer queiramos quer não, somos compelidos a consumir (e a apregoar, a vulgarizar?) todos as horas dos nossos dias desde… até….

Estes sãos ruídos que nos aguilhoam por mais livres que nos sintamos interiormente, por mais livres de obsessões, de frustrações e de raivas que nos queiramos sentir.

Que percepção mais justa desta realidade podemos ter?

Não sei se somos inocentes, mas devemos manter um silêncio de inocentes?

 

 

 

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publicado às 18:42

Poesia e Filosofia

por Zilda Cardoso, em 18.02.13

 

 

Estou a ler um livro fascinante de G. Steiner, A Poesia do Pensamento.

Difícil, claro.

 

Para já, só posso citar algumas frases que considero importantes para uma reflexão.

 

“A maior parte de nós não tem mais do que uma vaga ideia do que seja “pensar”, transformar em “pensamento” o bric-à-brac, o refugo e o lixo da nossa corrente mental. Adequadamente concebida – quando paramos para pensar no assunto? -, a instauração de um pensamento de primeira ordem é tão rara como a composição de um soneto de Shakespeare ou de uma fuga de Bach. Talvez na breve história da nossa evolução, não tenhamos ainda aprendido a pensar. Excepto para um punhado entre nós, talvez a designação de homo sapiens não passe de uma vanglória injustificada.

 

“Por que deveria um texto filosófico insigne ser mais acessível do que as altas matemáticas ou um dos últimos quartetos de Beethoven? Há imanente a um texto assim, um processo de criação, uma “poesia” que o texto revela ao mesmo tempo que lhe resiste. O grande pensamento filosófico-metafísico engendra “ficções supremas” no seu íntimo, ao mesmo tempo que tenta dissimula-las. A água estagnada das nossas ruminações indiscriminadas é, na realidade, a prosa do mundo. Não menos do que a “poesia” no sentido categórico, a filosofia tem a sua música, a sua pulsação trágica, os seus transportes, e até mesmo, ainda que mais raras vezes, o seu riso".

 

“Todo o pensamento começa por um poema” (diz Alain).

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publicado às 17:09

Silêncio: it's a wonderful world

por Zilda Cardoso, em 16.02.13

 

 

A noite… é noite e silêncio entre dia e dia e outro dia.

Mas gosto do silêncio, não de todo o silêncio.

Aprecio olhar o mundo a que pertenço

e que o mundo me olhe, o que é constituído por maravilhas,

Deslumbrante no meu conceito e que vale a pena olhar

e escutar em silêncio, em plena luz.

 

Também penso “what a wonderful world”:

Pelas mil tonalidades de verde das florestas inacessíveis

e pelo cristal líquido que cai do alto,

pelas pedras preciosas lavadas no rio…

 A neve cobrindo os cumes, dando-lhes formas obstinadas.

 

 Papoilas de um vermelho único entre os arbustos

cobrem os montes, flores desabrocham a todo o momento

e borboletas voam ligeiras e inconstantes...

Estranhos pássaros de requintados desenhos e cores

e animais cheios de humor e de ternura para os seus,

por tudo isso e pelo que não conheço,

têm razão: “it’s a wonderful world”.

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publicado às 20:02

enquanto o sol não brilhar

por Zilda Cardoso, em 13.02.13

 

Não estou cansada de estar triste

porque o sol tarda e eu gosto

da minha zona iluminada.

Não me importo que caia chuva pesada

que sopre um vento desalmado

no centro e no norte, moro a sul na cidade.

Não me culpo, quero aqui dias claros

mar azul e luzidio, ondas de espuma branca

contra as velhas rochas douradas.

E, mais perto de mim, as grandes árvores

de estranhos troncos enleados

folhagem verde e brilhante e firme

onde a briza não murmura nunca,

sob que podia passar, quase pisando as flores

miúdas amarelas como girassóis

por entre a quietude das ervas.

É isto que eu quero e não tenho hoje

nem tive todos estes dias baços.

Eis por que não estou cansada de estar triste,

vou continuar…

 

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publicado às 19:59

Sons e silêncio

por Zilda Cardoso, em 05.02.13

Por que me ocorre frequentemente o pensamento: não vou abandonar isto!? E logo: por que não? O que é que “isto” tem de interessante? Ou de essencial? De importante… a ponto de não o querer abandonar?

Nada, não sei.

São talvez todas estas doutrinas que nos impuseram desde crianças… sobre a importância do mundo… da vida…

Para quem é importante a vida? Para quem e para quê?

Toda essa filosofia… a ciência… e a religião… a martelar a mesma ideia… com palavras perturbadoras. Por vezes, falam de destino!

É o desejo de saber, e temos de ter tempo e inteligência para conseguir apreender o sentido… Mas… para quê?

As palavras perturbam, é o que sei. E não exprimem as coisas do mundo.

O mundo… O mundo?!

Há o mundo dos objectos e… o outro… onde a imaginação se pode exercitar de muito variadas maneiras antes de atingir a saturação. Este é um universo imenso, muito mais vasto do que o outro.

Aqui neste há as virtudes: a justiça, a prudência, a sabedoria… essas coisas. E também o amor, o altruísmo…O lugar onde a inadequação das palavras perturba ainda mais do que no dos objectos.

Foram os Gregos ou os Egípcios e Mesopotâmicos que procuraram explicar… com mitos?

 Gosto de mitos. Se tivéssemos continuado com mitos em vez de pretendermos usar a razão para reflectir sobre o princípio de todas as coisas, a esta hora já teríamos descoberto o princípio de todas as coisas incluindo as que aparecem, mudam e desaparecem.

Mas há a música, felizmente há a música, os sons da música que não sei a que mundo pertencem.

Quero que pertençam ao meu.

É isto que não vou abandonar, compreendo. A música… de que não conheço nada, mas que dizem ser combinação de sons e silêncios organizados no tempo. Que podem ou não ser de extrema qualidade, os sons e os silêncios!

A música diz tudo, diz de outra maneira. Diz tudo o que queremos dizer. Se formos educados, saberemos dizer o que queremos dessa forma e reconhecer o que os outros querem dizer porque saberemos lê-los.

Eu não sei, não sou educada em música. Poderei  sê-lo? Poderemos todos vir a sê-lo?

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publicado às 20:21

As pontes da cidade

por Zilda Cardoso, em 02.02.13

 

  
 

Três Pontes

Três pontes que ligam o Porto a Vila Nova de Gaia. A primeira é a Ponte D. Luiz I, a segunda é a nova Ponte do Infante e por fim a Ponte D. Maria

 

 

(imagem da internet)

Gosto das pontes que unem as cidades divididas por rios. Gosto das cidades assim divididas e unidas. Apreciaria que Porto e Gaia fossem uma atravessada por um rio deslumbrante, serpenteante, perigoso e com as mais belas margens que me foi dado ver.

Uma cidade única, separada pelo rio, unida pelas pontes – que sonho!

Quando eu era muito pequena, lembro-me, só havia duas pontes sobre o rio: o trânsito nas cidades deve ter crescido muito, pelo comércio, pela indústria, pela população. Uma ponte era a do comboio – chamada D. Maria, a outra - D. Luís com dois tabuleiros. Era a que a população utilizava para ir à festa popular, não sei qual. Que me lembre só ia a Gaia, uma vez por ano, dia dessa romaria.

Ou antes…

O meu Pai não era apreciador, mas fomos à romaria, talvez para ficar a conhecer e hoje poder falar dela. Quando regressámos ao fim da tarde, como toda a gente, a Ponte que tínhamos de atravessar tremia, dizia-se, com o nosso peso e inquietação. Oscilava muito e assustava. As palavras do meu Pai não serviam de nada, não me sossegaram: a ponte vibrava cada vez mais, porque as pessoas apressavam-se, quase corriam, arrastando as crianças, pensando na eminência da queda ao rio e… vamos lá… na hora do jantar.

Eu só respirei fundo quando pisei terra firme do lado do Porto e, por isso, penso que não voltei àquela festa: a perspectiva de cair à água suja e verde e fria não era de todo do meu agrado.

Por outro lado, que pena não ter nascido a tempo de atravessar o rio por uma ponte de barcas! Teria sido divertido, saltitar de uma barca para outra ou caminhar tranquilamente pelo estrado de madeira que passava por cima das barcaças unidas por uma corrente de ferro. Nunca teria faltado à festa popular porque a festa começaria no rio, no estrado, no baloiço das barcaças.

Já no século XIV houve aqui uma ponte de barcas construída para que o exército de D. Fernando passasse e acudisse à cidade de Guimarães cercada por castelhanos (lê-se na internet) e depois outras do mesmo género foram levantadas para a travessia regular do rio, destruídas ou desmontadas em tempo de cheias. Foi assim durante séculos, mas no princípio do século XIX,  uma de 33 barcaças ligadas por cabos de ferro e que abria para dar passagem a embarcações foi construída e, poucos anos depois, destruída de forma trágica quando a população do Porto  fugindo precipitadamente para sul às tropas de Soult enfiou num alçapão aberto na ponte e caiu ao rio. Morreram quatro ou cinco mil pessoas, má memória.

Abandonada a ideia tão poética de pontes de barcas, construiu-se a Ponte Pensil, já destruída mas de que restam os pilares, as duas de que falei, e a da Arrábida já nos nossos dias, com que passamos a ser a Aldeia da Ponte Nova, tão orgulhosos que estávamos da nossa ponte moderna. Todavia, temos mais: a de S. João, a do Freixo, a do Infante. Somos agora os orgulhosos habitantes da Aldeia das Muitas Pontes.

Não sei quais os convenientes e inconvenientes da unificação das cidades do ponto de vista político, falo do aspecto estético. Quero dizer, as cidades estão unidas e separadas, ninguém as separa mais nem as une mais, aqui a geografia é rainha e senhora. Mas talvez uma só Câmara zelasse melhor pelas duas como se fosse uma?!

As mais belas cidades da Europa são não apenas banhadas por um rio, mas têm um rio no seu interior, um rio cantado pelos poetas, pelos músicos, como o Sena ou o Danúbio que nunca vi azul ou o Tamisa desde há pouco razoavelmente perfumado. É a beleza das pontes que torna certas cidades incomparáveis.

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publicado às 17:24




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