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As exposições temporárias do Museu do Oriente têm para mim um encanto incomparável. Neste momento, há três cheias de poesia: Os Portugueses no Japão da Idade Moderna, (encomendas Namban ); Os Portugueses ao Encontro da sua História (em colaboração com o Centro Nacional de Cultura); e Os Papagaios de Papel (surgidos na China há mais de 2000 anos).
Relembro aqui Os Portugueses ao Encontro da sua História.
O Centro Nacional de Cultura organiza “embaixadas culturais que dão origem a laços e projectos registadas nos Diários de Viagem sempre da autoria de um artista plástico e de um escritor”. E são as ilustrações de quatro artistas portugueses resultantes de algumas dessas viagens ao Japão, à Indonésia e à Índia, o que aqui se mostra, e que acompanham as descrições dos escritores e, sem dúvida, as completam. Aliás, completam-se mutuamente – a escrita e a imagem.
Os artistas mostrados são Graça Morais, João Queiroz, José de Guimarães e Bárbara Assis Pacheco.
O texto que chamou a minha atenção foi o de Jorge Borges de Macedo num desses Diários de Viagem. Receio não serem exactamente estas as palavras que estão escritas e reproduzidas em painéis na sala do Museu, mas conto com a Isabel Maia Jácome para mas corrigir e completar.
Fala de um poeta que morreu em Osaka com cinquenta anos (Século XVII), um sublime poeta japonês. Nunca definiu a arte poética, mas a sua obra chegou até nós, graças às compilações e à devoção dos discípulos. Repassado de espiritualidade zen, o poeta viveu entre o que é permanente e o que flui devorado pelo fogo imperioso da descoberta da novidade, das limitações ultrapassadas… E o haiku renasce com ele e continua depois dele na evidência e no mistério que sustenta o mundo. Com os discípulos insiste nas qualidades mestras da poesia – a patine, a ligeireza, o picante. O drama da existência era expresso em pinceladas leves, transparência de humor, que é a substância do amor.
(Apresentação do livro de Yolanda Freitas a crianças e a adultos)
Quero dizer-lhes, o prazer que me daria saber inventar histórias para crianças... Teria muito gosto em escrever para vós as que fossem mais cativantes, as mais divertidas, aquelas com que aprendessem alguma coisa, não aquilo que se aprende nos livros de História e de Geografia, por exemplo, ou de Inglês, mas outro tipo de histórias e de conhecimentos.
Tentei, claro. Lembro-me de um conto a que chamei "O Carrinho Amarelo". O herói da história era um "mini-moke" pintado inteiramente de amarelo vivo, que existia na realidade e eu usava todo o Verão de casa para a praia e da praia para casa com enorme alegria minha e sobretudo da criançada. Um dia, com o carro cheio de miúdos, os meus filhos e os seus amigos, aventurámo-nos até Vila Praia de Âncora e encontrámos uma praia de rio lindíssima e apaziguada quanto a vento, não sei se já lá estiveram. Passámos uma tarde daquelas e de regresso a casa em Moledo em boa (boa não é muita, mas razoável!) velocidade pela estrada fora, grande algazarra, miúdos de pé agarrados aos ferros laterais, cantando - uma festa e um horror. De súbito, a capota do carro solta-se - a capota, sabem, aquela da frente, a que cobre o motor - solta-se e voa sobre as nossas cabeças e vai aterrar vários metros atrás ao lado da estrada.
Por momentos, ficámos muito assustados e garanto-lhes que não me assusto facilmente! Mas aquela aventura tinha sido uma enorme tolice. Ou não, que acham?
Ninguém se feriu, por milagre, foi daquelas coisas que só acontecem no mundo da fantasia, talvez fosse isso que me levou a transformar o episódio numa história infantil escrita.
Mas eu não sei contar histórias para crianças. Penso que é preciso ter o dom de comunicar com elas que a Yolanda Freitas tem – uma delicadeza de linguagem, uma intuição fabulosa para descobrir o que os há-de encantar, uma grande imaginação, boa memória e um saber viver com eles e como eles, como os pequenos, saber movimentar-se no seu mundo leve que é aquele a que aspiram os poetas e os artistas - chamado mundo da infância. Muitos pintores sobretudo do século passado pintavam o que só os mais pequenos saberão compreender. É linguagem simples e poética que pode sintetizar muita experiência e reflexão.
Repararam ou vão reparar nesta história que conta o que conta sem banalizar, o que é muito difícil quando se situam as histórias no nosso tempo que como é nosso, este que estamos a viver, parece muito vulgar, sem magia…
Mas o que conta a história? Bom, pronto, não vou dizer, vão gostar de a ver e de a ler.
E eu fico a pensar que, se no nosso mundo, em Portugal e no resto, alguns dos que agora têm o poder e não o tinham há uma geração atrás, se esses tivessem lido muito mais livros bons como este da Yolanda, se teriam sido tão malandrotes, como têm sido. Compreendem o que quero dizer?
Não vivemos apenas de fantasias e de coisas maravilhosas fora do nosso entendimento, se bem que elas sejam importantes para nós e nos sintamos espontaneamente atraídos por elas. Os contos de fadas separam os bons dos maus de forma absoluta e isso não é assim na realidade, mas pode levar os mais novos a perceber o que é bom que seja feito e o que não deve fazer-se. E que é bom ser bom e generoso. E que é bom evitar a violência. E que é bom respeitar os mais velhos. E os outros. Quaisquer outros, os próximos e os que estão longe.
Não há pessoas inteiramente boas nem pessoas totalmente más, cada uma tem em si qualidades boas e qualidades más. Alguns têm mais qualidades boas do que más; com outros acontece o contrário. E os mesmos comportam-se ora bem ora mal, e é aí que os livros da Yolanda nos podem ajudar. Ajudar a distinguir.
A Yolanda sabe introduzir nas suas histórias muitas ideias sobre estas escolhas sem acinzentar o mundo que descreve e que é um mundo simples. Ao mesmo tempo, são histórias que adoptaram os valores da nossa época, as circunstâncias em que vivemos e as nossas maneiras de educar e de sermos educados; as crianças estão a ser preparadas para viverem no mundo tal qual ele será em breve.
Ela sabe brincar com as personagens quando conta as suas aventuras e também tem perspicácia suficiente para fazer passar a mensagem que quer passar. É a responsabilidade de quem escreve para crianças – não conta apenas uma história. Nem precisa de descrever a realidade, mas simplesmente descrever uma realidade de outra ordem.
Tal como os mitos, a fábulas e as lendas, estas histórias que nos emocionam ajudam a resolver conflitos que são de sempre. E auxiliam sem dúvida a criança a compreender valores de conduta e de convívio. Ela tenta defender a sua independência e impor a sua vontade perante os que detêm o poder e que são os pais e os educadores; e há a rivalidade com os irmãos mais velhos: são os seus conflitos. Ela sente medos e carências, logo tem necessidade de segurança, de protecção, de amor. O simbolismo dos gestos dos heróis que personificam os problemas e os acontecimentos emocionantes descritos, ajuda a compreender o que são valores básicos.
É muito mais fácil que o cinema com as suas imagens coloridas em permanente movimento e a banda desenhada consigam emocioná-las facilmente, sem grande esforço de imaginação. Para que a escrita conquiste esse clima de prazer, de alegria é necessário que ela seja ainda mais sugestiva, estimulante e divertida que o cinema.
Agora vejam, as palavras que o escritor usa têm de ser daquelas mágicas, as personagens que põe a representar sugerem formas simples de agir, de conviver pensando nos outros… com bom coração. São modelos. O autor estará a formar a consciência e a inteligência de um ser humano na sua fase de amadurecimento mais profundo, está a transmitir valores, está a formar a personalidade. E para a criança, o esforço de imaginar cenas a partir da escrita é importante para o bom funcionamento da mente, mas pensem até que ponto a escrita precisa ser ainda mais estimulante e imaginativa do que a imagem.
Tudo razões a favor da boa literatura infantil. Olhem, recordaram-me há dias um poema de Jorge de Sena que é uma carta aos seus filhos: “Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso. É possível, porque tudo é possível, que ele seja aquele que eu desejo para vós”.
Faço meu, o desejo do Poeta – que o mundo seja ou venha a ser o que eu desejo para vós.
As minhas fotografias do mar quando está zangado são muito feias, medonhas. Aquela parece uma casa de bruxa com chaminé, pássaro negro e cabelos esguedelhados cinzentos espalhados por ali. Nada que se possa algum dia comparar com as da Primavera ou A. de Lima. (Vejam algumas no Facebook.) Havia muitos fotógrafos com ar de profissionais tão próximos da água que diria se preparavam para morrer por belas imagens das ondas altas de espuma rendada branca de noiva.
Uns minutos depois, a poucos metros daquele sítio, estava o rio divertido colorido, oferecendo um coração magoado, perfeitamente definido.
Vejam como os corvos marinhos e as outras aves observam a entrada da água no seu recinto.
E a garça-real tranquila.
E esta pernalta com frio.
Afinal é este o meu mar e não o das casas de bruxas.
Andei por seca e meca e terras de outro reino, mas não fui longe. Quero mostrar-lhes algumas imagens do que vi, pobres e pequenas imagens de coisas grandes e poderosas, demasiado semelhantes às que tenho visto por todo o lado.
Ora vejam.
Só para lhes dizer: OLÁ! OLÁ! OLÁ!
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