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(imagens da cidade gentilmente cedidas por Primavera Lima)
Desci à Baixa do Porto.
Há anos que não frequento essas ruas que antes calcorreava todos os dias por afazeres. Que mudanças teriam ocorrido, ia pensando e caminhando rapidamente, não tinha todo o tempo do mundo. E começava a cair uma chuva minúscula, levezinha.
Encontrei muitas diferenças, agradáveis… desagradáveis.
A cidade volta-se decididamente para os turistas estrangeiros e para as suas pequenas necessidades e desejos. Procura fazer negócio com isso, naturalmente. E então pululam pequenos restaurantes e cafezinhos com as suas esplanadas nos passeios, impensável há poucos anos. E muitos letreiros com imagens coloridas dos pratos que servem, não é preciso saber português nem qualquer outra língua para escolher.
Tudo na rua pode acontecer. Mesmo em frente ao Coliseu, exibem-se malabaristas na mira de uma moeda. E a maioria das pessoas passa e não dá importância. Há quem cante e dance e toque um instrumento musical… com resultado idêntico. Fazem um esforço para melhorar a nossa vida e a deles e só por essa razão… é louvável e merecem a moeda. Passei e não a dei… que horror!
Tornaram-se animadas as ruas da Baixa. Mesmo assim têm um ar muito usado, antigo quase gasto, e sujo. Vá lá, com optimismo, um pouco sujo.
Estava um calor húmido e a roupa colava-se à pele. Também porque continuava a cair a hipótese de chuva que não parecia.
Ia humedecendo.
Comecei a imaginar animais gigantescos dinossáuricos a respirarem para cima de mim com o seu bafo quente e vivo. Apressei-me.
Não pousava os pés no chão por várias razões. Mesmo assim, comecei a ficar cansada com aquele constante subir e descer… Clérigos… Santo António… Passos Manuel. Reparei que tinha que descer sempre que subia e vice-versa. Serão colinas? Quantas? Pensei que esta cidade não era de colinas.
Tinha partido do Bom-Sucesso, antigo mercado tradicional onde fiz as minhas compras de legumes e frutas durante anos, agora muito limpo e sofisticado, com cafezinhos e esplanadas, mesas e cadeiras no exterior lá dentro, sem animais jurássicos vivos nem outros desconfortos. Preparados para um pequeno-almoço não continental ou para comer e beber qualquer coisa ao longo do dia. Comprei um belo pão de alfarroba.
E voltei a partir da Torre da Cidade, aniversariante, passei na Cândido dos Reis, desci a rua da Fábrica, atravessei a avenida da Liberdade e na rua de Passos Manuel encontrei os saquinhos bordados para meter a alfazema de Moledo. Tal como procurava.
Pus um chapéu de pano que me abrigou da chuva. Fez surgir na minha cabeça, assim posta a ridículo, um pensamento capaz de se exprimir por inteiro nesta frase: Dos livres de espírito, é o reino dos céus.
Idiotice que me fez sorrir.
A chuva parou. Senti-me um pouco menos estúpida sem o chapéu. Entrei no carro que me levou de volta a um mundo mais deste mundo.
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