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Essa política

por Zilda Cardoso, em 16.11.12

Quem me dera estar a viver num país onde a política não seja o único tema de conversa. Apreciava que a política fizesse discretamente parte do meu mundo, não que fosse o meu mundo.

A minha vida tem sido variada, nesse aspecto. Vivi no tempo de Salazar sem política. Ele tratava de tudo, não precisava de me preocupar. Jovem, assim pensava: havia um trabalho a fazer, um mundo a descobrir...

Não, não precisávamos de nos inquietar. Ele tratava de tudo como sabia, de modo patriarcal, e nunca se apercebeu que já nos considerávamos crescidos e queríamos decidir as nossas contendas, com independência. Por nós.

Passámos por uma época revolucionária, razoavelmente interessante e estimulante em muitos aspectos e estamos num tempo que se tem prolongado cheio de peripécias, de lances imprevistos e previstos, onde há unicamente política. Essa política. E nenhum outro tema é possível. Nem sequer economia, educação, cultura. Discussões apaixonadas sobre ideologias? Nem sequer.

Tudo se transforma rapidamente em política que acaba por ser da máxima importância, a menos que queiramos fazer o papel de apáticos, ignorantes ou estúpidos no que respeita aos nossos próprios negócios. Interessamo-nos por ela, pois, não como coisa boa para que nos relacionemos bem uns com os outros, para que nos entendamos melhor, mas como coisa boa para que sejamos inimigos uns dos outros. Contudo, não foi com essa intenção que ela foi sendo criada e introduzida aqui.

É assim e aqui que vamos sofrendo uma vida de má qualidade, tosca, se posso dizer; de qualquer modo, muito mais imperfeita do que poderia ser.

 

Afinal, não sabemos tomar decisões e aceitamos o que afirmam, aparentemente cheios de convicção (mas com muito maus fígados,) os comentadores dos comentadores num frenesim mimético sem fim. Não procuram conhecer. E são eles, os comentadores dos comentadores dos comentadores que pululam vindos de todos os buracos e recantos sombrios e húmidos, os que, numa qualquer diminuta oportunidade, irradiam por instantes e são inacreditavelmente acreditados.

Sabem eles de que falam?

Sabemos nós de que falamos? Fomos instruídos sobre as melhores e mais justas decisões a tomar em ordem aos objectivos comuns ou mais convenientes para todos? Apenas falamos, a maior parte de nós, como se.

Estou desolada.

Estou desolada agora com a recente polémica que envolve Isabel Jonet. Os comentários deploráveis às suas palavras sensatas e verdadeiras tanto como à sua acção benemérita ilustram o que tenho tentado dizer sobre essa política.

Os seus processos não são os que vão resolver os problemas de pobreza e desigualdade, porque estes são estruturais e não se decidem dessa forma. Isabel Jonet sabe disso, melhor que qualquer outra pessoa. Sabe e tem larga experiência do seu trabalho voluntário: apenas quer ajudar. E tem ajudado e tem-se dedicado ao seu serviço de forma extraordinária e digna, criando uma organização exemplar no seu género.

O que só podemos agradecer-lhe.

 

 

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publicado às 21:25


11 comentários

De Isabel Maia Jácome a 17.11.2012 às 17:54

Concordo com o que diz, Zilda, sobre este zum-zum pseudo político. Tudo isto é ruído... ruído que pulula e nos a fecta a todos, perturbando a nossa capacidade de discernimento, obnubilando a nossa compreensão, dificultando a nossa acção...
...critica-se por criticar, sem a reflexão necessária, partilhada de forma cívica e não imediatista.
Tudo pode ser interpretado a bel prazer ou necessidade, sem qualquer respeito pelo que se pode constatar... sem qualquer respeito pela acção de anos e anos, como a de Isabel Jonet que, mais do que falar, falar, tem agido, voluntariamente... e em prol efectiva dos que precisam.
Que muitos dos que criticam façam mais do que criticar!
Com admiração e carinho,
Obrigada.
Sempre,
Isabel

De Zilda Cardoso a 17.11.2012 às 19:22

Muito obrigada, Isabel! Não podia deixar passar em branco: é tão revoltante! E tão desolador!

De Marcolino a 18.11.2012 às 11:58

Olá Zilda!
Quanto aos comentadores que, nem aves canoras nem papagaios sabem ser, comparo-os aqueles maridos incorrigiveis criticando continuamente os tarefas das esposas, incluindo os seus cozinhados que, no dia em que elas os medirem de alto a baixo, se remeterão, covardemente, a um silêncio que enobrecerá os afazeres das esposas, incluindo os seus riquissimos cozinhados...
No que respeita a Isabel Jonet, vi, na integra a reportagem; econfesso-lhe que, quando ela proferiu aquela tão controversa frase, disse cá para os meus botões: É agora que vão denegrir a tua tão nobre acção...
E assim aconteceu
Falar não custa nada, o mais dificil é saber utilizar cada palavra fazendo frases pedagógicas mas não contundentes, principalmente nesta altura de grande revolta entre centenas de milhar de pessoas, que já tiveram algum desafogo, mas agora estão a viver dias muitissimo dificeis, nunca dantes vividos...
Abraço de bom domingo!
Marcolino

De Zilda Cardoso a 18.11.2012 às 13:16

Ainda bem que pude ter a sua opinião sensata.
Diga-me: é difícil comentar no meu blogue?

De ZA a 18.11.2012 às 19:08

Caríssima Zilda:
O seu breve trecho é de facto um "bálsamo", dos meios de comunicação social que temos... e políticos.
Confesso que me recuso a ler / ouvir muitas notícias, porque enfermam de falta de sensatez, de fontes fidedignas e acima de tudo não ajudam o povo português a Crescer....diria mais, noticiam o que vende ou pior do que isso, para onde nos querem levar!!!
Parabéns pela sua lucidez.
Com muita amizade
José António INSLapa )

De Marcolino a 19.11.2012 às 02:05

Zilda,
A meu ver, não me é dificil interpretá-la, nem me retira qualquer tipo de vontade de a comentar.
O que me tem acontecido, ultimamente, é falta de tempo, de tal forma que nem sequer tenho escrito no meu blogue.
O FB instalou-se defenitivamente como um predador dos Blogues.
O FB dá primazia à perguiça mental ao clicarmos no «Gosto» e nada mais.
O FB é uma trituradora das nossas capacidades inatas de comunicarmos entre todos pela escrita criativa ou pela narrativa, com e sem imagens.
O FB impos-se-nos tão ditatorialmente que as altas figuras, de grande relevo, Presidente da República, Primeiro Ministro e outros enveredaram por nos dar certos recados via FB, é nós lemo-los sem opinar...
Felizmente, tudo quanto cai no excesso, tem o respectivo final, ou seja, suicida-se...
Sejemos serenos, continuemos a escrever porque que isso vale mais do que um trilião de Likes...
Bem mais tarde outros virão dar-nos razão!
Abra e uma óptima semana
Marcolino

De Zé João a 18.11.2012 às 19:57

Gosto da sua escrita! Com serenidade e desassombro comenta a atualidade como comenta a Rua do Paraiso.
Bem haja.

De CC a 18.11.2012 às 21:13

Zilda,
Pode alargar a pergunta que fez ao Marcolino sobre se é difícil comentar no seu blog?

Tendo por base que sim, respondo por mim.

O seu blog continua nos meus favoritos, sempre.
Visito-o com muita regularidade, quase diariamente.
Leio os post e chego ao fim com a sensação de que a Zilda não esqueceu nada, nem na forma nem no conteúdo. Saio do blog satisfeita e quase sempre com mais uma bocadinho de saber.
Para si pode não ser gratificante porque não tem feed back mas para mim, saber que posso contar com este espaço é bastante.

Fique bem!
Com toda a minha admiração e apreço

De Vicente a 21.11.2012 às 01:51

Olá Zilda,

Gostei muito do texto pois reflecte o que muitos pensam. De facto ou se "desliga" do envenenamento diário da política, dos politicos, do futuro catastrófico que nos vaticinam - hélas, certeiro - e se aproveita para ler, ouvir música, passear, conversar sobre assuntos verdadeiramente importantes ou então mirra-se e ficamos sêcos como os ratos do campo.

Já não estou tão de acordo quanto ao que parcialmente diz da Isabel Jonet: o seu trabalho e dedicação é indiscutível, eventualmente o seu "estilo" unipessoal de mandar poderá não ser o mais apetecível mas é eficaz.

Não aprecio "one woman/man show" pois conduz fàcilmente a glórias vãs e de envaidecimento, imprescindibilidade e perca progressiva de "visão".

Gosto de trabalhar em equipa, mas dando de barato que é a parte menos relevante, já acho obrigatório que deva ter alguém, mesmo que pontualmente, que a aconselhe na imagem institucional que deve transmitir para o exterior, sob pena de a sua impreparada expontaniedade poder vir a prejudicar a instituição.

Portugal é um país de raivosos, invejosos e tudo de "osos" que normalmente é mau, e gostemos ou não, por enquanto é assim.

Ora quando o povo diz que é uma "tia" a falar e a maioria do povo não sabe sequer o que é essa irritante expressão, mas não gosta de "tias", o importante aqui é que por razões fátuas não deixem de contribuir para as campanhas de alimentos, e muita gente assim ameaçou fazer.

Gente mesquinha, é verdade! Mas o mais rlevante é que cada vez mais aumentem as doacçõe de alimentos, sobretudo nesta época de aflição e provação.

Custava muito mandar uma número 2 falar, talvez com menos ênfase de "tia"?

Um consultor de imagem dir-lhe-ia quenas casas das "tias" nunca se comeu bifes do lombo todos osdias, nem sequer da "vazia" pois o dinheiro era mais para os arrebiques e festas doq ue para a qualidade da comida. Frase estúpida e inverdadeira e desnecessária .

Lavr os dentes com copo ou sem copo, a maior parte dos nossos filhos, quando podiam escapavam-se a lavá-los.

Minudências de "tia" que o povo detesta, não compreende e não se interessa.

Mais importante falar sobre a dor da pobreza, da solidão e do acolhimento seja por ela se conseguisse validar o tom ou por qualquer outro voluntário/a que até, e merecidamente, poderia salientar a obra que a Isabel tem estado a fazer.

Mas, esta é a minha opinião, é claro que por dizer tudo isto sinto-me ainda mais na obrigação de contribuir em maior quantidade na próxima campanha, não por causa da Isabel mas pelos pobres.

Todos passamos e deixamos um rasto de mais ou menos luz, mas isso é o menos importante!

De Zilda Cardoso a 21.11.2012 às 14:20

Peço-lhe que leia o meu novo texto sobre este assunto.
Ter um consultor de imagem seria entrar naquele mundo de "essa política" que certamente não agradaria a I. J. Ela esperaria que os ouvintes e leitores compreendessem as suas palavras sem colocarem as suas PAIXÕES como base de raciocínios.
Talvez de facto dê resultado para o fim em vista usar, ingenuamente nos discursos e para aumentar os donativos, uma certa ingenuidade. Que se fosse propositada deixava de ser ingénua. Também não creio que I.J. quisesse fazer isso.
Gostava que ela continuasse a ajudar, para bem dos que são ajudados e dos que ajudam, mesmo sabendo todos que não vai resolver o problema. Mas chamando a atenção para ele.

De Vicente a 25.11.2012 às 17:12

Obrigado Zilda pela sua resposta, mas o tema da Isabel Jonet passou a ser um "non-issue", ou seja já enjoa com tanto comentário contra ou a favor.

Acho, sobretudo que ela deve querer um pouco de paz e sossego: vou ouvi-la no Turf para os sócios, mas a conferência dela já estava programada.

Espero que fale do que ela sabe fazer tão bem que é tratar da pobreza dos outros e deixe de falar dela!

Tal como nós todos, fazemos "from time to time", coisas menos bem sucedidas e por isso se tivermos "consultores de imagem" no sentido seja institucional e não retiro uma vírgula ao que disse acima ou de amizade, de interesse por nos ajudarem a ser bem sucedidos na transmissão das nossas ideias, só temos a ganhar com isso.

O nosso "ego" ficar melhor ou pior tratado é irrelevante quando temos responsabilidades perante terceiros, como no caso dela: o importante é fazer bem o nosso trabalho "on behalf of" neste caso o do Banco Alimentar!

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