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clarividência ou talvez não

por Zilda Cardoso, em 28.07.17

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Quando era jovem, há muitos anos, tinha dificuldade em pensar com clareza. Muitas emoções e sentimentos se misturavam com pensamentos lógicos; e conhecimentos não amadurecidos levavam a conclusões precipitadas, insensatas…e pior.

Desde há pouco tempo, consigo pensar de forma muito aceitável, conveniente e justa. Pondo, em evidência, o que realmente importa. (É manifesto que sei o valor das palavras, o pouco valor…)

Simplificando. ..

Talvez pense mais acertadamente agora do que quando era nova, é isso que quero dizer.

Calculo o que está a pensar quem me lê, neste momento: Que idade tem ela? Coitada! (este coitada arrasa-me) Ela julga saber tanta coisa! Ou então: elas ou eles (velhos) julgam saber… (Seremos nós um conjunto ou um grupo com características semelhantes…? No entanto, não é conhecido, eu não conheço nenhum conjunto natural desses).

O que mais me diverte é que os mais novos, os muito mais novos, falam comigo de maneira diferente, falam como acham que é preciso falar com os velhos. Com complacência, além do mais. Pela razão de os velhos já não compreenderem, porque se não recordam ou porque sempre ignoraram.

Logo não vão agora ficar aptos para raciocinar minimamente com lógica como se impõe, no nosso tempo. Há sempre uma demência qualquer a espreitar, mais ou menos acentuada e destinada a acentuar-se. Enfim… como se os novos não fossem – a maior parte - completamente impulsivos e mesmo doidos acerca dos assuntos que lhes interessam, como se conclui facilmente das reportagens e filmes que passam diariamente na televisão (até os de banda desenhada).

E pelas notícias e conversas veementes em mesas redondas, quadradas e ovais, de todas as formas, sobre assuntos de transcendência total como o futebol. (Não tenho nada contra o futebol, tenho contra as análises e críticas impetuosas e inflamadas que nem sequer pretendem ser fundadas e merecidas).

A propósito de nosso tempo: sabem o que é o meu tempo? É um tempo que não existia “no seu tempo”, dizem eles, os novos, a falarem comigo. E “o vosso tempo” (o dos velhos) é o que já não existe, comentam. Como se o seu tempo se referisse apenas aos verdes anos de cada ser humano ou daquele grupo grande, cada vez maior. Como se o tempo de cada pessoa não fosse todo o seu tempo de vida e não apenas a juventude tão efémera como qualquer período da nossa vida. Que, por outro lado, não termina nunca, a vida não pára, não pára! Não pára? Essa agora!...

O que se fazia no seu tempo, não é o que se faz no nosso. E o que se faz no nosso, dizem eles agora, é mais técnico, mais cibercultural, mais virtual e digital e longitudinal...e incompreensível para vós.

Como se os velhos não pudessem assimilar coisas modernas, informáticas entrelaçadas, tecnologias de estarrecer… se quisessem, se se esforçassem, se pensassem que valia a pena! Sobretudo, isto, se pensassem que valia a pena pôr a funcionar as conexões dos respectivos neurónios (carregando num botão que apenas eles conhecessem).

Eu estou a ver os erros dos novos, as falhas deles quando lhes falo ou quando algum fala comigo de assuntos marcantes e que podem ser de muito variado volume e espessura.

E eu digo alto e bom som: pára com isso! Não estás a ver que não é assim, simplesmente que não é assim?! E até fico envergonhada: será que não sabe? Ou está a achar que eu não sei ou que não tenho capacidade para apreender? Que deve fingir que não entende porque eu nunca chegarei lá… e não vale a pena gastar tempo…?

A verdade, tão clara, parece ser… eles não saberem que eu sei. E isto magoa: é o tal estatuto de velho que há que alterar para termos a competência de sermos justos. Vivemos todos juntos, faz sentido, somos pessoas que coabitam o planeta Terra no mesmo período de tempo, com objectivos longínquos semelhantes.

Não estou a ser agressiva, estarei a marcar o meu território. Posso? É o que penso serenamente. Os meus jovens e menos jovens ouvintes ficam na deles, a maior parte do tempo, são incapazes de entender que tendo chegado a sua oportunidade, o seu momento, devem aproveitá-lo da melhor maneira, que não é rejeitando sem razão, ou empurrando para fora do barco, ou desclassificando.

É dando um passo em frente.

Há ocasiões em que gracejo, outras, lamento que não saibam aproveitar… Vejo que desfrutam tanto o facto de estarem finalmente em primeiro plano, de estarem em lugares de chefia seja no que for… Fruem tanto…

Têm razão.

E não vêm como ficamos felizes por ter chegado para eles o momento de mostrarem o que valem?

O que quero dizer com todo este arrazoado é que vejo, compreendo agora nitidamente que:

 - a população se deve considerar formada por um certo número de pessoas dissemelhantes que se misturam e vivem em conjunto (não descobriram outra maneira) ou

- por vários grupos  de pessoas com as características comuns que permitiram agrupá-las ou que se agrupassem e se diferenciassem uns conjuntos de outros (simplificando desse modo a vida de todos).

Porém, penso que esses grupos que se formaram e existem afinal na população em geral resultaram de mau entendimento do que são as pessoas que os constituem e de como podem contribuir para uma vida em comum.

Refiro-me especificamente a grupos de novos e a grupos de velhos formados por figuras com capacidades diferentes, qualidades e características físicas e mentais diversas. Mas talvez que o que têm em comum seja o facto de uns, os de um grupo, terem nascido antes de… e outros, de outro grupo, depois de… certa data. Não chega para justificar o isolamento, não se opõem, necessariamente.

O que afirmo é que podem viver colaborando nas tarefas que lhes competem ou que lhes são distribuídas, num tempo que é de todos – o seu tempo - como qualquer outro “habitante do planeta”. E no espaço que é de todos. Porque é mais o que têm em comum com ”toda a gente ”do que o que os distingue.

Daí pensar e repetir que não há razão para separação, quero dizer, não há motivo para irmos viver para Marte (prefiria Saturno, mais espaçoso e engraçado, bem desenhado).

Acrescento ainda: o que acontece connosco é estarmos fartos de coisas complicadas, difíceis e trabalhosas. Deixarmos tarefas para os novos executarem… é um privilégio nosso, não é um deles e que devam aceitar (com relutância, se forem bonzinhos).

Ocorre unicamente por serem jovens e ter chegado a sua oportunidade de terem e sustentarem o poder, de governarem o mundo. E de possuírem a sabedoria que lhes compete e concorre para o seu estatuto. E é o que lhes cabe por tradição. E por conveniências várias.

Eu entendo e permito-me com alegria deixá-los fruir. Alguns desses mais novos sofreram toda a vida falta de

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reconhecimento do valor da sua inteligência e das suas acções: autenticação essencial para uma vida saudável. Gostava de poder corrigir ainda essas realidades relevantes, se bem que reconheça que dificilmente falhas deste género na juventude podem alguma vez ser compensadas. Deixaram marca para sempre.

Ninguém vai descobrir como realizar estas mudanças de entendimento de um momento para o outro. As alterações nas mentalidades vão acontecendo, importa que se caminhe no sentido que descortino agora com nitidez.

Que pensarão os mais novos do que afirmo?

“Passou-se”, dirão. Pois.

 

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publicado às 14:23


2 comentários

De Victor a 28.07.2017 às 20:41

A compreensão é lenta. Porque há palavras que só as compreendemos muito tempo depois. Como se o seu verdadeiro significado, aquele implícito na intenção com que foram ditas, ficasse suspenso entre o que ouvimos e o que realmente quiseram dizer. E um dia, a propósito de uma lembrança, de uma conversa trivial ou por não termos mais nada em que pensar, elas regressam despidas do que subentendemos, nuas, tal como vieram ao mundo. Nesse momento, curiosamente, ao contrário de todas as expectativas e medos, não acontece nada. Rigorosamente nada. Não há sequer desilusão. Apenas compreensão, que é a lucidez resignada da vida...!
Continue a pensar com essa clarividência...com essa bondade...com essa lucidez...!

De Zilda Cardoso a 28.07.2017 às 21:39

Inteligente.
Obrigada pelo seu comentário.

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